quarta-feira, 18 de setembro de 2013

CRISTOVAM BUARQUE (PDT/DF) via facebook


CRISTOVAM BUARQUE (PDT/DF) FALA, NA TRIBUNA DO SENADO, EM 06-09-2013, ÀS VÉSPERAS DAS MANIFESTAÇÕES DO DIA DA INDEPENDÊNCIA DO BRASIL, SOBRE A CRISE DE REPRESENTATIVIDADE E DA CRIMINALIZAÇÃO DOS PROTESTOS POPULARES, ADVERTINDO SOBRE O RISCO DE AUMENTAR A DISTÂNCIA ENTRE OS ANSEIOS DO POVO E A DEMOCRACIA REPRESENTATIVA.

“(...) Uma notícia hoje de manhã me chamou a atenção: um grupo de jovens sentados em cima do carro da polícia, em forma de rebeldia e de deboche, impedindo o carro de avançar, até que algumas ações foram tomadas... E agiram assim porque não estão encontrando coisas positivas de nossa parte. Eles estão se manifestando por descontentamento, estão chegando ao ponto de mostrar que o Brasil vive uma guerrilha cibernética, porque convocada pela internet... O Estado e o povo na rua estão em conflito... Não se trata mais da guerra civil que vivemos, por 20 ou 30 anos, dos desesperados... Trata-se, agora, de uma guerrilha dos desiludidos... O povo enfrentando o Estado pelo descontentamento, pela desesperança... O que estamos fazendo?... Nós [representantes federais] estamos dando as costas para o que está acontecendo no Brasil... Eu creio que nós não estamos à altura do momento histórico em que estamos vivendo...”

“O povo cansou da impunidade..., das prioridades equivocadas..., do voto secreto no legislativo..., da tolerância do legislativo federal com a corrupção..., da ineficiência econômica..., do descaso dos serviços públicos..., da improvisação no tratamento de assuntos essenciais de interesse público..., da violência urbana..., do desprestígio do Congresso e de todos os partidos, sem nenhuma exceção... O povo percebeu que ter um carro não basta para ter um transporte satisfatório... E nós temos tido ‘governos do jeitinho’...” Quando se quebra a relação de confiança entre representantes e representados, “acaba o pacto social que nos une” e “partidos e sindicatos ficam renegados”... Assim, testemunhamos “revoluções sem líderes”...

Essas manifestações têm alterado a rotina das cidades, da economia... Em relação a elas, “devemos encontrar um caminho... E este caminho não é a repressão. Não tenho simpatia por manifestantes mascarados, mas me preocupa muito que comecemos proibindo os mascarados e..., no final, estaremos proibindo todos de irem para as ruas... Nós não estamos à altura de entender a gravidade desses dois fatos: a falência do acordo social e o surgimento de uma arma poderosa para manifestações que é a internet... Esta casa deveria construir um novo acordo social para o Brasil, um novo pacto social...”

“Estamos falando do futuro do Brasil que vocês [reporta-se, agora, aos estudantes de Brasilândia que estavam na plenária do Senado Federal] deveriam ter, que vocês merecem ter... Nós [representantes federais] não estamos fazendo como deveríamos, nós não estamos construindo... Por que não retomamos os trabalhos, nessa casa, em caráter permanente, fazendo um pacto social que recupere o casamento da sociedade com seu Congresso... Não falo somente de um pacto por pequenas medidas, de mudanças na forma de eleição...”

“Que tipo de economia nós queremos?... Ter apenas crianças matriculadas nas escolas não basta, mas sim escolas públicas da mais alta qualidade, para termos jovens construtores do Brasil e construtores deles mesmos... O que podemos fazer para que as pessoas não precisem de ir às ruas, num dia de festa e comemoração, para se manifestarem contra seus líderes?... Não estamos percebendo a gravidade do que nós vivemos... A tragédia está dando seus sinais... Os jovens, mascarados ou não, estão dando os sinais...de que as coisas não estão bem...”

“Devemos acabar com este famigerado voto secreto. É uma vergonha para cada político votar sem que seu eleitor saiba como ele votou... Não podemos tolerar o constrangimento de votar secretamente... Se nós mantivermos qualquer forma de voto secreto, estaremos jogando gasolina no fogo das manifestações, nessa guerrilha cibernética que acontece hoje no Brasil... Não é para jogar água na guerrilha cibernética, mas para dialogar..., oferecer respostas, propostas, novos rumos..., para que o Brasil possa ter de volta o seu povo em casa ou nas ruas festejando o 7 de setembro... Lamento este profundo divórcio que estamos vivendo entre o povo e as suas lideranças... Vou dar a minha contribuição, trazendo ideias, não apenas sobre Educação... Precisamos refazer este grande acordo nacional chamado Brasil...”
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Link de acesso ao discurso, na íntegra, de Cristovam Buarque: https://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=BRhXYwOAv5E#t=85


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Esta importante ‘jeremiada’ do Senador Cristovam Buarque mostra a sua profunda preocupação com a crise da democracia representativa no Brasil. No entanto, o tom central ainda é resgatar apenas a democracia representativa, para que o ‘povo’ fique em casa (se seus representantes se tornarem, de fato, ‘meritosos’ e representativos, pois os conflitos de ideias, interesses e projetos deveriam se traduzir apenas entre os representantes) e somente saia às ruas para festas. Nesse sentido, o discurso não colabora com o tema da democracia participativa, que é outra importante agenda que as manifestações têm trazido. Em alguma medida, há no discurso do senador um esvaziamento desta questão.

Assim, fiquei com a impressão de que a experiência das manifestações no Brasil, tal como significada pelo senador, não estaria cumprindo a sua expectativa de ‘povo pacífico’, que forma o seu olhar sobre “povo”. Por isso, parece-me que a sua ‘jeremiada’ tem um fundo de crítica contra os representantes que, por seu mau exemplo de corrupção e divórcio com os representados, são os efetivos responsáveis por o ‘povo’ estar perdendo a sua “essência pacífica”, não cumprindo sequer – se considerarmos a lógica liberal-democrática de mérito – as expectativas do sistema representativo democrático, que exige que sejam lideranças competentes com projetos consistentes para o país.

Resumidamente, a ‘jeremiada’ do Senador Cristovam Buarque adverte contra o risco de a democracia representativa estar colaborando, em função das suas lideranças atuais, para a sua autodestruição, mas não alça nada que aponte para uma valorização da democracia participativa. No final das contas, o seu discurso é isso, uma ‘jeremiada’: “Políticos, sejam bons representantes para o ‘povo’ voltar para casa e somente ir às ruas para festas, como ‘sempre foi’. Amém...”.

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