sexta-feira, 31 de março de 2006

Porque me contradigo?


Porque me contradigo? Pois bem, me contradigo, sou vasto, contenho multidões” Walt Whitman.
“Temos a arte para que a verdade não nos destrua” Fiedrich Nietzsche.

No projeto clássico e também no projeto moderno a tarefa do arquiteto consiste em ordenar. A finalidade da ordem clássica ou moderna é produzir um objeto que não seja contraditório. A não-contradição é um dos princípios lógicos do processo de conhecimento de Arsitóteles, quais sejam: da identidade, da não contradição e do terceiro excluído,
* A lógica da matemática adota como regras fundamentais do pensamento os dois seguintes princípios (ou axiomas): princípio da não contradição : uma proposição não pode ser verdadeira e falsa ao mesmo tempo./ princípio do terceiro excluído : toda proposição ou é verdadeira ou é falsa, verifica-se sempre um destes casos e nunca um terceiro.
Na arquitetura contemporânea ocorre a superação da ordem como controle e da idéia de forma como figuração. O controle se faz mais sutil, menos evidente; prescinde-se da geometria e nem imposições visuais para se manter estados relacionais adequadas. Aspira-se sistemas baseados em controle aberto mais que ordens fechadas (Manuel Gausa).

Termos:
Contradição: Ato ou efeito de contradizer(-se). Dito, procedimento ou atitude oposta ao que se tinha dito, ou a que se adotara anteriormente; falta de nexo ou de lógica; incoerência, discrepância; oposição às opiniões, idéias e sentimentos de outrem; objeção, desacordo.
Contraposição: Antinomia, antinomismo, assimetria, contradição, contradita, contraste, desconformidade, desencontro, desequilíbrio, desigualdade, desproporção, desuniformidade, discordância, discrepância, disparidade, dissemelhança, divergência, diversidade, incoerência, incompatibilidade, inconformidade, incongruência, oposição, polarização; ver tb. sinonímia de desinteligência / discrepância entre pontos de vista; desacordo, desentendimento.
Antinomia: contradição entre quaisquer princípios ou doutrinas. Posição ou disposição totalmente contrária; oposição.
Complexo: Diz-se de ou conjunto, tomado como um todo mais ou menos coerente, cujos componentes funcionam entre si em numerosas relações de interdependência ou de subordinação, de apreensão muitas vezes difícil pelo intelecto e que apresentam diversos aspectos.
Simples: que não é composto, múltiplo ou desdobrado em partes; que é feito de um elemento básico, que não se compõe de partes ou substâncias diferentes; singelo; que evita ornamentos dispensáveis; desprovido de elementos acessórios; que é elementar, não apresentando qualquer embaraço para sua compreensão; isento de significações secundárias; mero, puro; que não é acompanhado ou auxiliado por outrem; só, único; que não é sofisticado; modesto, singelo; habitual, comum; sem luxo, sem ostentação; singelo, modesto; que é espontâneo, franco e ignora simulações ou fingimento.
Etimologia: do latim singelo, não composto, só, único, que só é dobrado uma vez, tendo tomado o sentido moral de não complicado. Do latim sim (o mesmo que figura em singular) mais plex (que se dobra).
Coerência: Qualidade, condição ou estado de coerente; ligação, nexo ou harmonia entre dois fatos ou duas idéias; relação harmônica, conexão; congruência, harmonia de uma coisa com o fim a que se destina; uniformidade no proceder, igualdade de ânimo.

“As paixões nos remetem à produção, a produção à subjetividade, a subjetividade à potência do desejo, a potência do desejo ao sistema de enunciação, a enunciação à expressão, indo da expressão subjetiva à superfície do mundo pelo ato que se revela no sentido, que é uma abstração. E essa abstração é novamente desejo. Impressão de eterno retorno. Mas o que conta é menos essa circularidade dos signos do que a multiplicidade dos círculos, porque o signo não remete apenas ao signo em um mesmo círculo, mas de um círculo a outro ou de uma espiral a outra". (Gilles Deleuze, Félix Guattari: Mil Platôs).

quinta-feira, 30 de março de 2006


Os curso da matéria na filosofia da arte:

Os filósofos da antiguidade dividem-se em duas grandes correntes - materialistas e idealistas. O termo materialista significa aqueles que acreditam que o universo (tudo o que existe) é formado de matéria, inclusive as idéias são resultado do movimento da matéria (ou de energia, que é matéria, como mostrou Einstein). Os idealistas são aqueles que acreditam que existe uma origem, ou ponto de origem, ou ser superior que tudo criou.
Os filósofos Pré-socráticos ou filósofos da physis, que buscavam a arché, que era um princípio que, além de ser o princípio de todas as coisas, deveria também compor (ou fazer parte de) todas as coisas, e mesmo ser o fim último de todas as coisas.
Os filósofos, considerados pioneiros da filosofia ocidental, buscavam um princípio, a arché, que deveria ser um princípio presente em todos os momentos da existência de tudo. Essa arché deveria estar no início, no desenvolvimento e no fim de tudo
Estes filósofos são chamados da physis porque suas investigações giravam em torno do mundo material e físico, embora a arché pudesse ser algo não físico: números ou a-peiron (uma "coisa" incriada e sem um começo).
PHYSIS,
“Designa o processo de surgir e desenvolver-se; e abarca a fonte originária das coisas, aquilo a partir o qual se desenvolvem e pelo qual se renova constantemente o seu desenvolvimento; realidade subjacente às coisas de nossa experiência; o que é primário, fundamental e persistente, em oposição ao que é secundário, derivado e transitório”. G.Bornheim
Physis: é o que por si brota, emerge; é início de tudo e esse início está dentro da própria. Physis; é início, é fluxo ou força, também o psíquico e as idéias pertencem à physis.
Tudo está cheio de deuses diz Tales de Mileto, cheio de alma, de forças. A physis tem um princípio inteligente, que se conhece por suas manifestações: o logos, a inteligência, o espírito, o pensamento.
Physis não significa natureza, mas tudo o que existe. O objeto e a causa do corpo são um só: a Physis. A vida ativa afirma o pensamento; o pensamento afirma a vida. A vida aflora dos corpos, das partículas.

Para Platão a matéria é por natureza algo imperfeito que não consegue manter a identidade das coisas (muda sem cessar). O mundo de nossa experiência é mutável. Por isso a filosofia deve ocupar-se com o mundo verdadeiro- invisível aos sentidos - puro pensamento, o mundo das essências.
Para Aristóteles a idéia não tem existência em si, é abstraída pelo sujeito, o que importa é a realidade, para conhecê-la é preciso reduzi-la as suas causas primeiras - a pesquisa causal: material, motora, formal, causa final (a que se destina o objeto).
Aristóteles estabelece a metafísica cujos temas principais são existência e essência, estudo dos fundamentos das coisas. O conhecimento racional dependeria inteiramente dos objetos do conhecimento. Exige a distinção entre ser e parecer, entre realidade e aparência, a aparência só pode ser compreendida e explicada pelo conhecimento da realidade que subjaze a ela.
Téchne, para Aristóteles a arte é uma forma de téchne, cujo o exercício depende de uma série de requisitos. Arte hábito de produzir com reta razão
Téchne significa meio de fazer, de produzir, assim os processos artísticos são aqueles mediante o emprego de meios adequados, permite fazer bem determinada coisa. Assim, Aristóteles coloca os requisitos da arte não em forças misteriosas — inspiração que vem do divino, mas nos poderes e habilidades do artista que configura pela força de sua imaginação, estruturas criadoras, a poiesis, que é produção e fabricação. É um produzir que dá forma, uma criação que organiza e instaura uma realidade nova. Idéia para Aristóteles significa o mesmo que formas, são essências, substratos metafísicos, responsáveis pelo ser das coisas, não há o antagonismo platônico entre matéria e idéia, pois as coisas passam a existir para Aristóteles, na medida em que a essência, a forma universal se individualizam na matéria.

A arte com poiesis, atividade formadora e a idéia de belo, objeto de contemplação Há uma boa distância. A produção da arte decorrente da atividade prática depende do sujeito para acontecer. Assim natureza, tem seu movimento próprio (geração e degeneração das coisas); tem como causas principais a matéria e forma enquanto que a arte nasce da ação formadora mobilizada pelas necessidades humanas, acrescenta uma dimensão puramente artificial à natureza. A matéria nada pode gerar por si mesma depende da forma que a delimite e determine um sujeito que a conceba e produza; em Platão a forma é tão-somente idéia, que existe separada das coisas (modelo a priori), no mundo inteligível. Em Aristóteles ela é principio ativo, principio originário e organizador. A alma que dá vida ao organismo, seria a forma do corpo. Essas causas naturais aplicam-se à arte. A forma é a idéia concebida pelo artista. Portanto é um ato de inteligência que através da prática, determina a matéria, gerando um novo ser, que se denomina obra. O movimento da obra é prático. A arte como poiesis assemelha-se à natureza, seja no processo formativo seja na própria forma.
Na tratadística de Leon Alberti 1490 derivada de Aristóteles há o Edifício-corpo: personagem, que tem forma e depende do espírito e decorre da matéria dependente da natureza, que são unidas no ato de construir.
O edifício tem partes, subordinadas ao todo e solidárias entre si, cumprem funções específicas e diferentes, são operações universais seja para a casa ou a cidade.
Na arquitetura moderna os procedimentos de projeto baseavam-se numa visão da resistência dos materiais e do cálculo estrutural ‑ a verdade (científica) dos materiais.
Petrus Berlage (influenciou Mies) só deve ser construído o que for claramente edificado – emprego lógico, adequado, segundo a lógica estrutural e a natureza/ comportamento deste material. Na estética da vanguarda simular materiais era considerado kitsch.
A estética da máquina confrontava-se com a manufatura – havia o desejo de fazer crer nenhuma mão havia tocado seus objetos.
A idéia de começar do zero, de apagar os rastros, determinava a escolha dos materiais: Não há como deixar rastros no vidro (nem no aço), material liso e frio, onde nada se fixa. “As coisas de vidro não têm nenhuma aura. O vidro é em geral o inimigo do mistério” Walter Benjamin.
A produção em industrial em massas (até os anos 1970) criou a sociedade do descarte (Alvim Toffler): “os antimaterialistas tendem a minimizar a importância das ‘coisas’. No entanto as coisas são altamente significativas não só por sua utilidade funcional, mas também por seu impacto funcional TOFFLER.
Problema contemporâneo da aceleração, das relações telemáticas (internet), o tempo e o espaço desapareceram como dimensões significativas do pensamento e da ação humanos. Objetos (ocupar espaço durante um tempo, marca humana)/ O mundo de nossa sensibilidade é um mundo de diálogos com as formas das matérias, físicas ou psíquicas.
Nas várias linguagens da arte, o conteúdo expressivo da obras, é articulado de modo formal, nos termos característicos de cada linguagem, sendo os valores e as vivências traduzidos em formas espaciais. FORMA: modo de ser, feitio, aparência, configuração, disposição. A idéia de forma sempre abrange um princípio organizador, estruturador, uma ordenação que se torna manifesta.

AS COISAS (Arnaldo Antunes)
As coisas têm peso, massa, volume, tamanho, tempo, forma, cor, posição, textura, duração, densidade, cheiro, valor, consistência, profundidade, contorno, temperatura, função, aparência, preço, destino, idade, sentido. As coisas não têm paz.

Gaston de Bachelard
Poéticas do fogo, do ar (movimento), da água (matéria: massa é o esquema fundamental da materialidade) e da terra (a dialética entre as matérias duras e moles/ forças e intimidade), a imaginação produtiva, a energia do trabalhador.
A mão, matéria, mãe palavras plásticas
alquimia da água e do fogo, na condução das metamorfoses que transitam entre a terra e o ar, na dinâmica dos ciclos de criações, contínuas florescências
(...) diante do fogo e a imaginação descobre que o fogo é o motor do mundo; ou sonha-se diante de uma fonte, e a imaginação descobre que a água é o sangue da terra; que a terra tem uma profundidade viva" (Bachelard, 1988 c: 169).

Como reação ao essencialismo/ ao desejo do etéreo/ não corporal/ a matéria ganha na arte contemporânea um papel de destaque.
A arte conceitual gera, nos anos 1970, o conceito de "instalação" – um arranjo cênico de objetos, que vem a se tornar a linguagem predominante da arte no fim de século. Variante da arte conceitual é a land art (arte da terra), dos ingleses Richard Long e Robert Smithson, que intervêm em formas da natureza.
Nos anos 70, na Itália, sob influência da arte conceitual e também como reação à "assepsia" minimalista, surge a arte povera (arte pobre). O material das obras é inútil e precário, como metal enferrujado, areia, detritos e pedras. Na combinação dos elementos, a arte povera põe em questão as propriedades intrínsecas dos materiais (que podem mudar de características com o tempo, ou ter qualidade estética inesperada) e o valor de uso na economia capitalista contemporânea.

segunda-feira, 27 de março de 2006

Externalidades


Arnaldo Antunes: Pensamento vem de forae pensa que vem de dentro, pensamento que expectorao que no meu peito penso. Pensamento a mil por hora,tormento a todo momento. Por que é que eu penso agorasem o meu consentimento? Se tudo que comemoratem o seu impedimento, se tudo aquilo que choracresce com o seu fermento; pensamento, dê o fora, saia do meu pensamento. Pensamento, vá embora, desapareça no vento. E não jogarei sementesem cima do seu cimento.
Rimbaud: É falso dizer: penso. Dever-se-ia dizer: pensa-se em mim
Lacan: "Sou onde não estou, estou onde não sou".
Fernando Pessoa: Tudo quanto penso, tudo quanto sou. é um deserto imenso onde nem eu estou.

domingo, 26 de março de 2006

Nós somos desertos


“Nós somos desertos, mas povoados de tribos, de faunas e floras. Passamos nosso tempo a arrumar essas tribos, a dispô-las de outro modo, a eliminar algumas delas, a fazer prosperar outras. E todos estes povoados, todas essas multidões não impedem o deserto, que a nossa própria ascese; ao contrário, elas o habitam, passam por ele, sobre ele ( o deserto a experimentação sobre si mesmo é nossa única identidade, nossa única chance para todas as combinações que nos habitam (...)”DELEUZE In DELEUZE & PARNET, 1998, p. 19.