segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Não temos o direito de ir à praia diz Priscila Pedrosa Prisco

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NA semana passada, a redação do Justificando recebeu a mestranda na Universidade Federal Fluminense (UFF) e membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ Priscila Pedrosa Prisco. A ativista do círculo de cidadania criticou a política de violência do Estado carioca, a comoção seletiva da classe média, entre outros temas ligados ao momento.
Priscila chamou atenção, em primeiro lugar, ao alarde que se tem feito sobre os arrastões. Explicou que os atos infracionais já acontecem há anos, sempre no verão, e para combatê-los são colocadas as polícias nas praias. As novidades, no entanto, são duas: a primeira se refere à antecipação da operação verão nesse ano pelo prefeito Eduardo Paes, enquanto a segunda surgiu da decisão do juiz em acolher o Habeas Corpus impetrado pela Defensoria Pública. A lei, o básico, tem sido interpretada, pelo senso comum, pela imprensa, como um fator impeditivo da polícia trabalhar. Como se a polícia só pudesse trabalhar dessa forma, criticou.
Para a pesquisadora, a adoção da violência policial como política pública acaba por estigmatizar e criminalizar determinados grupos - negros, periféricos, e pobres -, gerando ainda mais violência no cotidiano. Desde que nascem, as crianças das favelas são submetidas à violência. Passam a vida inteira sendo humilhadas, tomando tapas na cara, vendo suas mães apanharem, os amigos morrerem, são torturadas. E você acha que isso não vai ter nenhum reflexo em sua formação como pessoa?, perguntou Priscila.

Espiral de violência

Prisco afirma que todas essas violências, somadas à política policial de barrar e levar para inquérito jovens a caminho dos bairros da zona sul, são nada mais que segregações, políticas de prevenção puramente genéticas, muito próximas das políticas nazistas, absolutamente desconectadas dos efeitos que podem causar no cotidiano. É uma espiral de violência, explica.
"É muito comum você ver os cariocas da zona sul, a classe média se queixando - ah, mas aí nós não temos direito de ir à praia, nós não temos liberdade de ir. Eu creio que não, não temos liberdade de ir e vir, não temos liberdade de ir à praia ali feliz e contente, enquanto uma guerra se instaura na nossa cidade sem que nós, que vivemos na bolha, na zona sul, no cercadinho, não tomemos consciência da situação que acontece nas áreas mais pobres da cidade" - afirmou.
Para ela, essa ausência do "direito de ir à praia" decorre diretamente da falta de importância e relevância que é dada à cotidiana violência sofrida moradores das favelas e outras comunidades menos favorecidas economicamente. Não é possível que uma política pública imponha um nível de violência desse tipo, como impõe nas favelas, nas UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), um nível de violência policial altíssimo, sem que isso vá repercutir nos grupos privilegiados.
"Então quanto mais se pedir o Estado, a violência de Estado, quanto mais se pedir a morte das pessoas na zona norte, nas favelas, mais a gente vai ficar preso. Não é possível você viver numa cidade segregada dessa forma e achar que você não tem nenhuma responsabilidade e que isso nunca vai repercutir na sua vida de rei, né, de príncipe" - finalizou.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Ivana Bentes domingo Rio de Janeiro setembro de 2015


Estranhos no Paraíso! Beirou o insuportável o clima de conflito e agressão à juventude negra nas praias do Rio neste domingo de sol. Começa nos ônibus com policiais dentro, revistando, buscando, afrontando, reprimindo. Os meninos reagem, são pura potência e energia, não aceitam mais o racismo da polícia e de alguns moradores e comerciantes da Zona Sul.
Se tem roubos pontuais, a maior parte das olas juvenis são um fenômeno coletivo das galeras que se juntam, se autoprotegem e "tocam o terror" com uma violência simbólica (e também de fato) que responde a uma violência real, continuada, programática!
A policia mata nas favelas, achaca e prende preferencialmente os meninos negros. Os garotos na Vieira Souto se impõem em grupos, zoam, cantam alto, assustam com sua sociabilidade de tribos juvenis. Clima de tensão, stress, correria em Ipanema. Grupos entrando amedrontados nos restaurantes porque um policial atira pra cima para dispersar os garotos negros que andam juntos.
Um bunker de carros de polícia e carros de reportagens das principais TVs concentrados no Arpoador esperam a próxima correria. Um circo midiático em torno de um moleque negro perseguido na areia. Oito jovens negros dentro de camburões! Mães, namoradas, irmãs, amigos explicando a policias que "ele não é ladrão", mais as operações são pela cor da pele, alguns meninos são levados no bolo, ou por que reagem a truculência e suspeição contra pobres!
Em todos os pontos de ônibus policiais aos montes olhando para cada menino, mulher, criança negra como suspeitos! Moradores e porteiros dos prédios chiques nas portarias comentando a violência, e alertando seus iguais (os brancos) que passam pra tomar cuidado!
Os garotos e os grupos nos pontos de ônibus estão revoltados: "se me tocarem, se jogarem gás de pimenta dentro do ônibus, vamos dar porrada!". "Não adianta prender, a Dilma vai mandar soltar", diz uma homem branco pronto para um linchamento na rua! Racismo, rejeição, ódio de classe, entre os grupos. Querem expulsar a juventude negra do paraíso!
"Somos todos iguais na praia", nunca fomos! Só que agora tem uma garotada que não aceita, não vai aceitar o apartheid "cordial" das areias cariocas!
Podem chamar de arrastão ou do que for, podem criminalizar, pode colocar no Jornal Nacional e no Fantástico, enquanto não tiver um arrastão pra mudar essa mentalidade racista os meninos vão responder com o que tem: seus corpos e sua potência!
P.S 1. O que está por trás desse clima de apocalipse que culpabiliza e criminaliza os jovens negros é também uma reação para reverter a decisão do juiz Pedro Henriques Alves, do Rio, de acabar com prisões por suspeição dos jovens nos ônibus: "A iniciativa surgiu após dezenas de jovens terem sido apreendidos nos últimos meses a caminho das praias da Zona Sul, sem que estivessem praticando atos infracionais." http://www.tjrj.jus.br/.../home/-/noticias/visualizar/22921
P.S 2 Moradores de Copacabana cercam e agridem ônibus com jovens que voltam da praia:
— "Abre a porta, abre a porta, motorista! Só tem ladrão. Vamos dar porrada. Fotografa eles, só tem ladrão — dizia um deles, enquanto espancava um adolescente, chutado várias vezes. "

Anarcomiguxos III Lula e Friedman

















"Aaaiin, o governo Lula mudou a cara do Brasilll!"
Fez reforma política? Não.
Fez reforma tributária? Não.
Fez reforma agrária? Não.
Fez reformas urbanas? Não, pelo contrário, deixou as empreiteiras fazerem a festa.
Fez reformas neoliberais? Sim! E continua até hoje com sua sucessora.
Mudou a cara do Brasil em que sentido?
Fez o Bolsa Família e o Prouni?
Porra, isso é coisa do Friedman.
Ele que dizia "o Estado até pode dar subsídios à educação, mas o dinheiro que cada família recebe para colocar o filho na escola deve ir para o ensino privado, o Estado não deve manter escolas publicas."
Prouni é isso aí.
E Bolsa Família funciona como o imposto negativo, outra ideia do Friedman.
Até o mimimises . org elogia o Bolsa Família! Se isso é a "social democracia" do Lula como diz o Emir Sader, nem quero imaginar quando essa porra virar liberal mesmo.
Afinal, que porra de mudança o governo do PT fez neste país?

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

É a Globo que dá ao Brasil uma nota de mau pagador por J. Carlos de Assis*

É a Globo que dá ao Brasil uma nota de mau pagador
São os jornalistas da Globo, como Bonner, que dizem que a nota é um 'atestado de mau pagador'. Isso é mentira e esconde inúmeros interesses.
J. Carlos de Assis*
Entre todas as patifarias ideológicas vomitadas pela Velha Mídia, sobretudo pela TV Globo, relativamente às decisões das chamadas agências de risco, a mais sórdida é a que define a nota emitida por elas como um atestado de bom ou mau pagador. Ora, como se pode dar atestado de mau pagador antes que se saiba que a empresa ou país pagaram suas obrigações? Seria um atestado de não pagamento futuro? Se é assim, é melhor para o país que não pague agora; assim, ficará com algum dinheiro em caixa para eventualidades!
É claro que isso tudo é um absoluto nonsense. Não há a mais remota possibilidade de o Brasil suspender o pagamento de suas dívidas em função do que dizem as agências de risco. Temos reservas internacionais de quase 400 bilhões de dólares. É verdade que, sobretudo por erros acumulados na política cambial do passado, e sobretudo por causa da estúpida taxa de juros, temos também muitas dívidas externas de curto prazo. Contudo, o balanço nos é ainda favorável. E não precisamos, para isso, de nota de bom pagador de agências de risco.
O fato extraordinário de que não é a agência, em si, que usa essa terminologia – ela libera apenas uma nota -, mas a forma como a TV Globo, por sua conta e risco, “explica” a nota. São os jornalistas da Globo, como Bonner, que dizem que a nota é um “atestado de mau pagador”. Como consequência, caindo a nota, perdemos o status de bom pagador mesmo que nada nos tenha sido cobrado e a economia funcione como antes.
A embromação não para aí. A nota das agências é um expediente tremendamente arbitrário. Se tivesse um mínimo de cientificidade não teria havido o desastre de 2008, no qual todas as agências de risco – rigorosamente, todas – haviam dado nota de “bom pagador” AAA a empresas, bancos e títulos que, por suas fraudes, quase destruíram o sistema financeiro mundial. Sob aperto do Congresso para explicar o que, afinal, havia acontecido, todas combinaram a mesma resposta: O que fizemos foi dar nossa opinião, mais nada.
Então qual é a razão para a Grade Imprensa dar tanta atenção às agências? Simplesmente porque elas funcionam como a vanguarda dos interesses financeiros, e são os interesses financeiros que dão suporte à Velha Imprensa. No caso atual, a agência está dando um sinal para que o Governo brasileiro mantenha taxas de juros básicas extorsivas e estrangule o orçamento público para tapar o déficit primário, irrisório em relação ao orçamento como um todo, o qual, caso mantido, não traria qualquer consequência negativa para a economia real.
*Economista, doutor pela Coppe/UFRJ, autor do recém-lançado “Os Sete Mandamentos do Jornalismo Investigativo”, ed. Textonovo, SP. Pode ser adquirido pela Interne

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Panelaços ? Atitude de coxinhas? Sei não...Celio Gari via facebook

Panelaços ?
Atitude de coxinhas?
Sei não...
71% de rejeição com certeza não é da casta que está atrelada e enriquecendo com o governo do PT.
Banqueiros, empreiteiras e os grandes empresários estão rindo a toa e fazendo de tudo para manter este governo no poder pois nunca tiveram tanto lucro.
A casta não representam os 71% de rejeição deste governo e sim os trabalhadores que tem que pagar com o ajuste fiscal, perda de direitos trabalhistas, e a precariedade dos serviços públicos promovido pela chapa PT e PMDB.
O reflexo no município do Rio de Janeiro é o mesmo que temos em Brasília,uma chapa composta por PT e PMDB.
Que demiti trabalhadores por lutarem por direitos, precariza os serviços essenciais, como hospitais, escolas públicas, transportes públicos além da prática de remoções de comunidades arbitrárias a favor do capital.
Quem está suportando presões e injustiças, somos nós trabalhadores que estamos perdendo direitos e perdendo nosso trabalho, condições de compra e de vida social
Fora Dilma ?
Porque não fora toda a chapa, PMDB e PT ?
PT, PMDB e PSDB é que perderam as condições políticas de governar.
E se a Dilma cair, o ajuste fiscal permanecerá e não se iludam com Michel Temer, Lula , FHC e Aécio.
O povo precisa é organizar um lava chato nesta casta do poder PT, PMDB e PSDB e não deixar se enganar ou se iludir com esta falsa polarização desta direita. Pois no Brasil a esquerda nunca assumiu o poder.
Um país que carece de representatividade, que não valoriza a saúde, educação, além dos profissionais. Vou além, os meios de transportes estão numa precariedade que só , reforma agrária não existe, demarcações das terras indígenas !
Tá difícil .
Como pode um país tão rico por natureza ter tantos pobres ?
Porque os estudantes das redes públicas de ensino não conseguem passar nas provas da UERJ, UFRJ, UFF entre outras universidades uma vez que são públicas ?
Eu penso se esses universidades são públicas quem tem que estudar nelas é quem estuda em escolas públicas ou estou enganado ?
E porque não se faz passeatas contra corrupção, retiradas de direitos trabalhista, remoções etc... Que afeta de fato o povo?
As manifestações de junho de 2013, será que voltará ter um novo levante?

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Hipótese sobre o Brasil - Brasileiros

Hipótese sobre o Brasil - Brasileiros

Alfredo Herkenhoff: A Globo fez o monstro. E agora decidiu conter. Mas a revista Veja e os Monstros criados pela Globo agora acham que são Monstros Independentes.

A Globo fez o monstro. E agora decidiu conter. Mas a revista Veja e os Monstros criados pela Globo agora acham que são Monstros Independentes.
São pulgas, Estou me divertindo com os vídeos da turma do domingo 16 nas ruas. E rindo com o ridículo de senadores que até ontem eu compreendia como do bem, ou do lado que compreende que só a Educação nos Salva. Mas! Cacilda, que decepção com Cristovam falando do dia 16. As aparências enganam. Um bobalhão disfarçado de educador.
Bela reportagem sobre a turma por ter sido escaneada pela Folha de Sampa durante o desfile jota hawilliano pela Avenida Paulista no domingo 16.
Só nove por cento dos brasileiros não acham a Dilma horrorosa, pensam eles lendo e vendo os veículos desses herdeiros no poder midiático tradicional acima dos partidecos naquele rodízio brasiliense da roubalheira na incumbência democrática dos cargos públicos de poder...
Ah, mas no meio do caminho tinha a política da inclusão social...
Pensam eles abobalhados: mas só nove por cento não estão aqui com a gente na Av Paulista segundo as pesquisas, mas a Folha, já no esquema da contenção da Globo e do Trabuco-Levy-Bancos-Empreiteiras-Dilma=Lula-Renan e The New York Times, sim, a Folha da Velha Barão de Limeira com esses todos fez o acordo> E estou também nesse acordo...
Sobre a multidão que fez a passeata do domingo 16 na Paulista tudo o que se sabe é que sempre se soube, mas só agora ganha letras e ganha imagens,voz... Agora se sabe quem são esses manifestantes graças ao acordo...
A Folha fez o que ela e a Globo não fizeram nas patrióticas reportagens sobre as megas marchas insensatas de abril e março, quando não entrevistaram quem tinha ido pedir impeachment e tinha acreditado cegamente nelas. Agora não, agora a Folha mostrou a loucura da rua burra...
A Globo, a Folha e a Dilma e a malandragem política de Renan, Janot e The New York Times acertaram. Agora é a verdade: A Folha estatisticou e vai estatisticar tudo daqui pra frente. E mostrou na segunda-feira pós domingo 16... Mostrou o que? Quem foi...
Mostrou que quase oitenta por cento das poucas centenas de milhares que no total foram às ruas em duzentas cidades no domingo 16 votaram em Aécio.
Esses manifestantes então sonharam em convencer quem? Convencer os que lá foram porque já tinham votado em Aécio? Ou foram às ruas convencer a maioria que votou em Dilma como eu e que não se arrependeu como eu não me arrependi? E não fui lá e não gostei do que vi e ouvi...
Essa classe média privilegiadinha foi fazer passeio dominical com camisa amarela de enclausurados pelo FBI, mas eles foram marchar já sem o apoio total da Folha e da Globo, foram lá quiçá ainda confiantes na força de uma cambaleante Veja...
Será que eles estão pensando que a Veja e eles, manifestantes na Paulista 16, ainda são os Monstros da Indignação?
E sonham com maluquices, derrubar, mediante uso de caras camisas amarelas, a Era Lula e Dilma?
Usaram caras camisas amarelas emblemáticas de encarcerados como um ex-governador do Estado de São Paulo na Suíça e de um ainda amigo-acionista da Rede Globo nos States...
E será que ainda acreditam que vão conseguir alguma coisa com camisa amarela da grife Nike fruto de contrato com pré foragidos que nem mais embarcam pro exterior porque podem ir e podem não poder mais voltar pro Brasil?
Mas qual a novidade?
Já especulo: a novidade é a Folha, são as Org Globo, o The New York Times, a Igreja Católica do papa Francisco, a Dilma Búlgara, o Lula Nine Fingers, Eu, Alfredo, o Janot, o Supremo, o Renan e claro com ele o Senado, os amigos ali de Geraldo Alckmin, sim, Aécio e Eduardo Cunha se lascaram, e agora todos nós estamos ficando contra os monstrinhos que criamos e que se acham monstrões no ridículo da última exibição que foi o domingo 16...
Sim, todos nós, nessas contradições nossas estamos aqui nesses dias, mas estamos pelo melhor do Brasil nesse momento, ou pelo menos pior do Brasil nesse momento, sim, nós estamos diante de três fenômenos sociais, políticos e culturais, estamos diante de três desafios pontuais numa crise que poderia talvez se tornar institucional com sangue, mas são pequenas três forças sociais ou políticas, diante de três lepras, sim, lepras políticas, lepras que sonham com uma crise institucional ou com golpe de estado, mas que agora com o acordão se veem elas três diante não mais de uma crise institucional porque não mais haverá, porque os mentores dela desistiram dela pelo perigo e pelos prejuízos, mas diante de um impasse: quem vai ficar do meu lado?
Sim, restam sim esses cacos dessa granada, essas três pequenas lepras, ou forças ou fenômenos residuais que diante da verdade cruel da política não costumam dar em nada, mas incomodam... E vamos là, restam essas três forças morais ou residuais, das quais duas são zero perigo.
Só uma delas é ligeiramente dangerosa.
Qual é?
Calma.
As duas resultantes sociais não perigosas, engendradas pela maluquice que se recompôs, são a classe média de roupa amarela, a que bate panela de barriga cheia e fala merda na rua, e aquela classe política do aloprado em Brasília com o seu baixo clero torcendo por ele sem ver o óbvio, mas que logo mais vai ver que ele está sendo enquadrado, vai ver que o líder está prestes a ser algemado e enjaulado.
E a terceira força perigosa que talvez não seja uma pulga?
Não respondo por discípulos de Berlusconi, desculpa, discípulos de della Pietra...
Paraná é assunto muito sério pra ser tratado por Alfredo. Isso é coisa pra Janot, Globo, Folha, Trabuco, Levy, Supremo, The New York Times, Senado Federal, tucanos e petistas, ou petralhas...
Sou apenas um elo nessas reflexões... Precisamos da democracia até o último dia de nossas vidas.
E mal estamos começando.
Estamos começando mal.
Leia o editorial sobre o Brasil, lance do The New York Times que traduzi horas atrás e que está rolando agora na edição impressa em Manhattan do jornal desta edição de terça, 18 de agosto....

"A idade de ouro da classe média" via Cleuber da Silva Junior

"A idade de ouro.
O chamado milagre econômico brasileiro permite a difusão, à escala do país, do fato da classe média. [...] Essa explosão das classes médias acompanha, neste meio século, a explosão demográfica, a explosão urbana e a explosão do consumo e do crédito. [...]
Vale realçar que no Brasil do milagre, e até durante boa parte da década de 1980, a classe média se expande e se desenvolve sem que houvesse verdadeira competição dentro dela quanto ao uso dos recursos que o mercado ou o Estado lhe ofereciam para a melhoria do seu poder aquisitivo e do seu bem-estar material. Todos iam subindo juntos, embora para andares diferentes. Mas todos das classes médias estavam cônscios de sua ascensão social e esperançosos de conseguir ainda mais. Daí sua relativa coesão e o sentimento de se haver tornado um poderoso estamento. A competição foi, na realidade, com os pobres, cujo acesso aos bens e serviços se torna cada vez mais difícil, à medida que estes [os pobres] se multiplicam. Vale a pena lembrar as facilidades [p. 109/110] para a aquisição da casa própria, mediante programas governamentais com que foram privilegiados, enquanto os brasileiros mais pobres apenas foram incompletamente atendidos nos últimos anos do regime autoritário. A classe média é a grande beneficiária do crescimento econômico, do modelo político [ditadura] e dos projetos urbanos adotados.
Tal classe média, ao mesmo tempo que se diversifica profissionalmente, aumenta seu poder aquisitivo e melhora qualitativamente, por meio das oportunidades de educação que lhe são abertas, tudo levando à ampliação do seu bem-estar (o que hoje se chama de qualidade de vida), conduzindo-a a acreditar que a preservação das vantagens e perspectivas estivesse assegurada. [...] Tudo o que alimenta a classe média dá-lhe, também, um sentimento de inclusão no sistema político e econômico, e um sentimento de segurança, estimulado pelas constantes medidas do poder em seu favor. Tratava-se, na realidade, de uma moeda de troca, já que a classe média constituía uma base de apoio às ações do governo.
Forma-se, dessa maneira, uma classe média sequiosa de bens materiais, a começar pela propriedade, e mais apegada ao consumo que à cidadania, sócia despreocupada do crescimento e do poder com os quais se confundia. Daí a tolerância, senão a cumplicidade, com o regime autoritário. O modelo econômico importava mais do que o modelo cívico. Eram essas, aliás, condições objetivas necessárias a um crescimento econômico sem democracia. Quando o regime militar esgota seu ciclo, a democracia se instala incompletamente na década de 1980, guardando todos esses vícios de origem e sustentando um regime representativo falsificado [...] (p. 110)
A escassez chega às classes médias.
Tal situação tende a mudar quando a classe média começa a conhecer a experiência da escassez, o que poderá levá-la a uma reinterpretação de sua situação. Nos anos recentes, primeiro de forma lenta ou esporádica e já agora de modo mais sistemático e continuado, a classe média conhece dificuldades que lhe apontam para uma situação existencial bem diferente daquela que conhecera havia poucos anos. Tais dificuldades chegam em um tropel: a educação dos filhos, o cuidado com a saúde, a aquisição ou o aluguel da moradia, a possibilidade de pagar pelo lazer, a falta de garantia no emprego, a deterioração dos salários, a poupança negativa e o crescente endividamento estão levando ao desconforto quanto ao presente e à insegurança quanto ao futuro, tanto o futuro remoto quanto o imediato. [...] A tudo isso se acrescentam, dentro do próprio lar, a apreensão dos filhos em relação ao futuro profissional e as manifestações cotidianas desse desassossego.
Já que não mais encontram os remédios que lhes eram oferecidos pelo mercado ou pelo Estado como solução aos seus problemas individuais emergentes, as classes médias ganham a percepção de que já não mandam, ou de que já não mais participam da partilha do poder. Acostumadas a atribuir aos políticos a solução dos seus problemas, proclamam, agora, seu descontentamento, distanciando-se deles. Elas já não se vêem espelhadas nos partidos e por isso se instalam num desencanto mais abrangente quanto à política propriamente dita. Isso é justificado, em parte, pela visão de consumidor desabusado que alimentou durante décadas, agravada com a fragmentação pela mídia, sobretudo televisiva, da informação e da interpretação do processo social. A certeza de não mais influir politicamente é fortalecida nas classes médias, levando-as, não raro, a reagir negativamente, isto é, a desejar menos política e menos participação, quando a reação correta poderia e deveria ser exatamente a oposta. (p. 111)"
Milton Santos. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. Edição de 2011.

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

COM TUDO ISSO, PRA QUE IMPEACHMENT? Vários via facebook

COM TUDO ISSO, PRA QUE IMPEACHMENT?
texto de Marilda Teles Maracci :
"A proposta do ministro da Fazenda Joaquim Levy para retomada do "crescimento" (Agenda de cooperação legislativa) vai na mesma linha dos eixos apresentados por Renan Calheiros e atinge diretamente indígenas, pobres e meio ambiente (sobre isso veja o post de Andrea Zhouri que compartilho abaixo).
Parece que começa a fazer sentido a crise política (com consequências econômicas) protagonizada pela oposição e grande mídia (crise travestida de direita X "esquerda"-?).
A violação dos direitos indígenas e populações do campo-águas-florestas, o saque ao meio ambiente, já tão agravados até então, parecem ainda insuficientes para o grande capital.
Tais medidas propostas por Levy parecem também sinalizar sentido à mudança de estratégia da Globo. Será que as cortinas desse trágico espetáculo inciado após as eleições começam a se fechar? Na dimensão do real (pós espetáculo) parece que o que se desenha é um saldo muito, muito tenebroso e com significativa licença social produzida-manipulada (manifestações de direita, fascistas, desgaste da cultura crítica etc)... e... sem impeachment!!!???
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<<"Que vergonha! Que tristeza! Para sair da crise governo propõe saquear indígenas, pobres e meio ambiente! São os mesmos a pagar a conta, sempre!! Realmente grave a situação! Vejam alguns pontos da proposta do Levy!!
Revisão e implementação de marco jurídico do setor de mineração, como forma de atrair investimentos produtivos;
Revisão da legislação de licenciamento de investimentos na zona costeira, áreas naturais protegidas e cidades históricas, como forma de incentivar novos investimentos produtivos;
Revisão dos marcos jurídicos que regulam áreas indígenas, como forma de compatibilizá-las com as atividades produtivas;
Estímulo ao desenvolvimento turístico, aproveitando o câmbio favorável, e à realização de megaeventos. Incluir a eliminação de vistos turísticos para mercados estratégicos, aliado à simplificação de licenciamento para construção de equipamentos e infraestrutura turística em cidades históricas, orla marítima e unidades de conservação;
PEC das Obras Estruturantes – estabelecer processo de fast-track para o licenciamento ambiental para obras estruturantes do PAC e dos programas de concessão, com prazos máximos para emissão de licenças. Simplificar procedimentos de licenciamento ambiental, com a consolidação ou codificação da legislação do setor, que é complexa e muito esparsa;">> (por Andréa Zhouri)"

PL 2016 ANTITERRORISMO por Adrianao Pilatti via facebook

"""A gente percebe que as coisas vão muito mal quando coisas bizarras e absurdas começam a acontecer sem causar escândalo, quando o inominável se torna rotina, quando o grotesco se torna corriqueiro. A deslavada utilização do poder dito "público" para fins privados, para a conquista, a rapina e a vingança. As fuzilarias e as matanças cotidianamente renovadas. As meias verdades e as deturpações em bocas vermelhas, azuis, furta-cores e midiáticas. A transformação de monstruosidades em lei.
A Câmara dos Deputados aprovou na tarde desta quarta o texto-base do Substitutivo do relator ao PL 2016, o primeiro mais horrendo que o segundo. Um verdadeiro aleijão jurídico-penal, um manancial de barbaridades contra as liberdades, os ativismos e os movimentos sociais. Uma excrescência digna do Estado Novo ou da ditadura militar-empresarial. Emendas estão sendo votadas neste momento.
O assunto simplesmente não é notícia na impren$a autoproclamadamente tão comprometida com o "Estado de Direito". O assunto não é assunto nas redes nem para "vermelhos" nem para "azuis", não existe no horizonte de suas disputazinhas, ódios e ambições. Enquanto esse ato institucional era votado, sua obtusa autora falava em democracia, soberania popular, legitimidade e outras coisas de que não entende nem respeita. Farsa a que uma claque igualmente farsante ou obtusa aplaudia contra um outro golpe possível, a sua vez reclamado por outra claque pró-autoritária, enquanto a liberticida a quem a primeira claque apoia tinha sua obra jurídico-fecal aprovada pelo mesmo covil que a combate com selvageria. Surreal.
As claques organizadas se preparam para desfilar nos dias 16 e 20. Nenhuma delas protestará contra o PL 2.016. Falarão em democracia, legalidade, direitos, mas silenciarão diante da legislação de exceção que está sendo gestada no ventre da irresponsabilidade. Por mais estranho que pareça, esse conluio entre as gangues de Cunha e Dilma não deixa de fazer sentido, embora num sentido perverso. O ato institucional de Dilma Rousseff encampado pela Câmara terá como alvo aquilo que todos os poderosos realmente temem: as ruas verdadeiramente contestadoras, os movimentos autônomos, os novos ativismos, o direito de resistência contra os podres poderes. É a grande revanche contra 2013, é a grande medida preventiva para que ele não se repita.
Dilma Rousseff, senhoras e senhores deputado(a)s que hoje estão programando esse assassinato em massa das liberdades: não esqueceremos, não perdoaremos, não relevaremos. A apresentação e a aprovação desse projeto são um risco traçado no chão: a partir de agora, onde estiverem aqueles que, por ação ou omissão, produziram esse resultado macabro, não poderão estar os que defendem escrupulosamente as liberdades. Não encham suas bocas hipócritas para falar em liberdade e democracia enquanto apoiarem, por ação ou omissão, esse golpe cruel contra o poder constituinte.
Dá vontade de jogar a toalha. Só que não." Adriano Pilatti via facebook

domingo, 9 de agosto de 2015

OS BANCOS, O RENTISMO, A GLOBO E A CRISE Luiz Oliveira E Silva‎Conjuntura &

OS BANCOS, O RENTISMO, A GLOBO E A CRISE Luiz Oliveira E SilvaConjuntura & facebook
Trabuco, presidente do Bradesco, hoje na Folha:
"Políticas monetária e fiscal austeras apenas não bastam. A crise política é mais forte que a própria crise econômica. Isso abala a confiança e retarda a retomada. Todos os participantes desse processo –políticos, Executivo, autoridades – têm de pensar grande. Precisamos ter a grandeza de buscar a convergência.
(...)
Uma pesquisa da KPMG desta semana, sobre o humor dos investidores, mostra que o Brasil está entre os três países de preferência, porque os bônus que oferece são concretos para um mundo que está atrás de taxas de retorno. Então, o capital que está investido aqui pode dar um retorno maior e mais seguro que em outros países. Mas precisamos botar isso para funcionar. A pasmaceira tem um custo, e o custo é diluído para toda a sociedade, mesmo para aqueles setores sociais que nada têm a ver com os dissensos que estão acontecendo."
Comentários:
1. O banqueiro quer dizer com isto que o governo federal está fazendo a sua parte com ajuste fiscal e controle de inflação com elevação da taxa de juros, mas o Congresso e a oposição de direita estão atrapalhando.
2. Tudo que os bancos e os rentistas querem é ajuste fiscal e controle de inflação com elevação da taxa de juros, sem sobressaltos.
3. As Organizações Globo são a vanguarda armada do rentismo. Isto ajuda a entender a mudança de posição dos Marinho...

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

A TEMPESTADE DE AGOSTO Giuseppe Cocco

A TEMPESTADE DE AGOSTO
O MURO ESTA CAINDO e ninguém sabe o que está atrás dele.
Toda a imprensa hj é atravessada por essa sensação de "fin de régime", do "si salvi chi può". 
Inclusive a IMPRENSA ECONOMICA que em geral ñ faz demagogia e olha direto pras variações nas bolsas e nos bolsos: hj é um boletim do front depois da derrota.
Alguém até grita: "Torni a bordo..."... ma não funciona.
O TRANSATLANTICO ESTA A DERIVA.
O AJUSTE virou rapidamente uma recessão perversa acompanhada de inflação das tarifas de serviços públicos caríssimos e de péssima qualidade.
A operação LAVA-JATO apenas está começando e se anuncia msm como uma "mãos limpas". Multiplicam-se as delações premiadas. É TODO o sistema, o MURO que - pelo visto - está desmoronando.
CONSTERNAÇÃO diante das reputações destruídas que - mesmo sem compartilhar o projeto e a política - muita gente defendeu (eu por exemplo).
DESERTO POLíTICO ocupado por uma justa indignação que - depois de dois anos de irresponsável campanha governista sobre a " onda conservadora", ruma para a direita mesmo.
A ÚLTIMA CARTADA: Mercadante e Temer chamam para A UNIDADE NACIONAL, poucos meses depois da campanha eleitoral onde a violência do marketing foi proporcional à mentira.
Os MOVIMENTOS SOCIAIS ORGANIZADOS chamam para uma contra-manifestação. Dessa vez colocaram para depois, no dia 20. Querem protestar contra a direita (que está no governo) se apoiando em toda a base do governo.
O pano de fundo, um milhão de "colunas" de política e economia.
O GRANDE AUSENTE : A MULTIDÃO de JUNHO DE 2013.
MAS SOMENTE JUNHO PODE RESOLVER A EQUAÇÃO.
Mas junho foi desconstruído pelos que agora correm o risco de serem varridos ... e com eles toda a esquerda.
Junho era o que faltava na Argentina e na Venezuela: um movimento de crítica radical das ilusões e corruções neo-desenvolvimentistas que não escutava as sereias das corruções neoliberais.
Junho virou um ENIGMA, e ninguém fala mais dele.
Mas tudo veio de junho..
Junho é a flor do deserto... agora está em baixo da areia... ñ enxerga o sol ... mas só ela pode nos anunciar uma nova terra... até porque junho não vai voltar.....

terça-feira, 21 de julho de 2015

Entrevista com novo reitor da UFRJ Roberto Leher em Brasil de Fato

Grandes grupos econômicos estão ditando a formação de crianças e jovens brasileiros”
Em entrevista exclusiva, novo reitor da UFRJ, Roberto Leher, aponta os impactos da lógica mercantilizada sobre a educação brasileira e aponta que como grupos financeiros tentam dominar a educação pública.
Um grande negócio. É assim que o novo reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Roberto Leher, enxerga o novo momento da educação brasileira.
Em entrevista ao Brasil de Fato, o professor titular da Faculdade de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRJ traça um panorama do atual estágio da educação no Brasil, e as conclusões não são nada animadoras.
Para Leher, que tomará posse nesta sexta-feira (3), os recentes processos de fusões entre grandes grupos educacionais, como Kroton e Anhanguera, e a criação de movimentos como o Todos pela Educação representam a síntese deste processo.
No primeiro caso, ocorre uma inversão de valores, em que o primordial não é mais a educação em si, mas a busca de lucros exorbitantes por meio de fundos de investimentos. No segundo, a defesa de um projeto de educação básica em que a classe dominante define forma e conteúdo do processo formativo de crianças e jovens brasileiros.
O movimento Todos Pela Educação é uma articulação entre grandes grupos econômicos como bancos (Itaú), empreiteiras, setores do agronegócio e da mineração (Vale) e os meios de comunicação que procuram ditar os rumos da educação no Brasil.
Para o professor, o movimento se organiza numa espécie de Partido da classe dominante, ao pensarem um projeto de educação para o país, organizarem frações de classe em torno desta proposta e criar estratégias de difusão de seu projeto para a sociedade.
“Os setores dominantes se organizaram para definiram como as crianças e jovens brasileiros serão formados. E fazem isso como uma política de classe, atuam como classe que tem objetivos claros, um projeto, concepções clara de formação, de modo a converter o conjunto das crianças e dos jovens em capital humano”, observa o professor.
Confira a entrevista:
Brasil de Fato - Muitos setores denunciam a atual mercantilização da educação brasileira. O que está acontecendo neste setor?
Roberto Leher - De fato há mudanças no que diz respeito a mercantilização da educação, diferente do que acontecia até 2006 no Brasil. Os novos organizadores dessa mercantilização são organizações de natureza financeira, particularmente os chamados fundos de investimento.
Como o próprio nome diz, os fundos de investimentos são fundos constituído por vários investidores, grande parte estrangeiro, como fundos de pensão, trabalhadores da GM, bancos, etc, que apostam num determinado fundo, e esse fundo vai fazer negócios em diversos países.
Em geral, os fundos fazem fusões, como é o caso da Sadia e Perdigão no Brasil. Mas é o mesmo grupo que também adquiri faculdades e organizações educacionais com o objetivo de constituir monopólios.
Esse processo levou a Kroton e a Anhanguera - fundo Advent e Pátria - a constituírem, no Brasil, a maior empresa educacional do mundo, um conglomerado que hoje já possui mais de 1,2 milhão de estudantes, mais do que todas as universidades federais juntas.
O que muda com essa nova forma de mercantilização da educação?
O negócio do investidor não é propriamente a educação, é o fundo. Ele investiu no fundo e quer resposta do fundo, que cria mecanismos para que os lucros dos setores que eles estão fazendo as aquisições e fusões sejam lucros exorbitantes. É isso que valoriza o fundo.
A racionalidade com que é organizada as universidades sob controle dos fundos é uma racionalidade das finanças. São gestores de finanças, não são administrados educacionais. São operadores do mercado financeiro que estão controlando as organizações educacionais.
Toda parte educacional responde uma lógica dos grupos econômicos, e por isso eles fazem articulações com editoras, com softwares, hardwares, computadores, tablets; é um conglomerado que vai redefinindo a formação de milhões de jovens.
No caso do Brasil, cinco fundos têm atualmente cerca de 40% das matrículas da educação superior brasileira, e três fundos têm quase 60% da educação à distância no Brasil.
Quais os interesses dessas grandes corporações para além do econômico?
A principal iniciativa dos setores dominantes na educação básica brasileira é uma coalizão de grupos econômicos chamado Todos pela Educação, organizado pelo setor financeiro, agronegócio, mineral, meios de comunicação, que defendem um projeto de educação de classe, obviamente interpretando os anseios dos setores dominantes para o conjunto da sociedade brasileira.
Em outras palavras, os setores dominantes se organizaram para definiram como as crianças e jovens brasileiros serão formados. E fazem isso como uma política de classe, atuam como classe que tem objetivos claros, um projeto, concepções clara de formação, de modo a converter o conjunto das crianças e dos jovens em capital humano.
Em última instância, é com isso que eles estão preocupados: em como fazer com que a juventude seja educada na perspectiva de serem um fator da produção. Essa é a racionalidade geral, e isso tem várias mediações pedagógicas.
A aparência é de que estão preocupados com a alfabetização, com a escolarização, com o aprendizado, etc. E de fato estão, mas dentro dessa matriz de classe, no sentido de educar a juventude para o que seria esse novo espírito do capitalismo, de modo que não vislumbrem outra maneira de vida que não aquela em que serão mercadorias, apenas força de trabalho.
De que maneira eles interferem nas políticas educacionais do Estado?
Como sociedade civil, os setores dominantes buscam interferir nas políticas de Estado. O Todos pela Educação conseguiu difundir a sua proposta educativa para o Estado, inicialmente por meio do Plano Nacional de Educação (PNE) - que aliás foi homenageado com o nome Plano de Metas Compromisso Todos pela Educação, em referência ao movimento. Com isso definiram em grandes linhas o que seria o PNE que está vigente.
Articulam por meio de leis, mas também da adesão de secretários municipais e estaduais às suas metas, aos seus objetivos. Articulam com o Estado, que cria programas, como o programa de ações articuladas, em que a prefeitura, quando apresenta um projeto para o desenvolvimento da educação municipal, tem que implicitamente aderir às metas do movimento Todos pela Educação.
Temos um complexo muito sofisticado que interage as frações burguesas dominantes, as políticas de Estado e os meios operativos do Estado para viabilizar esta agenda educacional.
Mas como se dá isso na prática?
Quando um município faz um programa de educação para a sua região, ele já deve estar organizado com base no princípio de que existe uma idade certa para educação, que os conteúdos não devem se referenciar nos conhecimentos, mas sim no que eles chamam de competências, que o professor não deve escapar deste currículo mínimo que eles estão desenvolvendo por meio de uma coerção da avaliação.
A escola que não consegue bons índices no Idep [Índice de Desenvolvimento da Educação Básica] é penalizada, desmoralizada, sai nos jornais, e isso cria um constrangimento que chega ao cotidiano da sala de aula, e as prefeituras pressionadas por esses índices acabam sucumbidos às fórmulas que o capital oferece. A mais importante delas é comprar sistemas de ensino, apostilas, que são fornecidos pelas próprias corporações.
O professor está em sala de aula, recebe apostilas, exames padronizadas que foram feitos pela corporação, e na prática, ao invés do professor desenvolver um papel intelectual, criador, ele tem que ser muito mais um aplicador das cartilhas, um entregador de conhecimento, e isso obviamente esvazia o papel do professor que tem consequências diretas com o processo de formação.
A formação esperada do educador não é uma formação enquanto intelectual, mas sim como alguém que sabe desenvolver técnicas para aplicar aquelas pacotes que as corporações preparam.
E há resistências a isso?
Existe um complexo de situações onde as resistências, as tensões são muito grandes, o que traz infelicidade aos professores e aos estudantes, mas tudo isso é muito difuso. As resistências acontecem na forma de lutas sindicais, quando fazem greve criticando a chamada “meritocracia”, os sistemas de avaliação.
Aparecem aqui e ali, mas é forçoso reconhecer que existe um complexo de controle sobre as escolas que restringem muito a margem de manobra dos trabalhadores da educação para desenvolverem um projeto pedagógico autônomo e crítico.
Essa situação é agravada quando a própria direção da escola, que deveria pensar como a escola se auto governa, vem sendo ressignificada como um papel de gestão. O diretor e os coordenadores são pensados como gestores na lógica de uma empresa, que deve cumprir metas, fiscalizar o cumprimento delas e tentar atingir essas metas de todas as formas.
Temos uma mudança de referências quando a própria equipe de coordenação da escola se torna uma equipe de gestores. No documento Pátria Educadora há uma possibilidade de punição dos professores que não cumprirem as metas.
Por sinal, o Pátria Educadora é um dos programas carro chefe do governo federal. Como você avalia este documento?
Não casualmente, esse documento foi elaborado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), atualmente dirigido pelo ministro Mangabeira Unger. Ele parte de um diagnóstico de que o modelo de desenvolvimento baseado em commodities se esgotou com a crise mundial, com seus preços despencando depois daquele período de ouro entre 2004 e 2009.

Crédito: Antônio Cruz/Agência Brasil
Com a desvalorização dessas commodities, Mangabeira chama atenção para o fato de que o Brasil deveria buscar outra forma de inserção na economia mundial que não fosse apenas de commodities.
E a minha hipótese é que eles estão sinalizando nesse documento que o Brasil deveria ser uma espécie de plataforma de exportação, assim como já existe na fronteira norte do México, em alguns países asiáticos - o modelo chinês foi isso nos anos 90, de ser um local em que a força de trabalho é muito explorada, recebe um treinamento específico que permite uma exploração muito grande, e esses países entram em circuitos de produção industrial de maneira subalterna, explorando o que seriam sua vantagens comparativas: baixo custo de energia, da força de trabalho, baixa regulamentação ambiental, e isso daria vantagens competitivas novamente ao país.
O drama é que a concepção do Pátria Educadora tem como correspondência a ideia de que a formação da maior parte da força de trabalho no Brasil deve ser por um trabalho mais simples, e isso tem consequências pedagógicas muito grande.
Se é para formar para o trabalho simples, a maior parte das escolas podem ser instituições estruturadas para a formação de um trabalho de menor complexidade, que seria desdobrados em processos de formação técnica de cursos de curta duração, cujo exemplo mais conhecido é o Pronatec, em que grande parte dos cursos são aligeirados para a formação de uma força de trabalho simples - tanto aquela que já estará inserida no mercado quanto aquela que constitui o que podemos denominar de um exército industrial de reserva.
O documento Pátria Educadora altera a racionalidade da organização da escola quando vislumbra escolas que vão formar forças de trabalho de menor complexidade. É importante destacar que no documento encontramos uma formulação muito perigosa de enormes consequências para o futuro da educação brasileira, que é a referência que o Mangabeira faz da adoção de um modelo tipo SUS (Sistema Único de Saúde).
O que é isso?
O modelo SUS teve como objetivo assegurar o direito ao atendimento à saúde de maneira universal, e isso poderia ser feito tanto pelo órgãos públicos quanto pelas entidades privadas.
Quando Mangabeira reivindica o modelo SUS, claramente está sinalizando que a formação do conjunto da classe trabalhadora deveria ser feita em nome de uma suposta democratização, realizada tanto pelas instituições públicas quanto pelas organizações privadas.
Isso é congruente com o PNE aprovado em 2014, ao estabelecer que a verba pública é aquela utilizada nas instituições públicas, mas também em todas as parcerias público-privadas, como o FIES, PROUNI, Ciências Sem Fronteira, PRONATEC, Pronacampo, sistema S, tudo isso entra como recurso público.
A rigor, estamos diante de uma política que pode indiferenciar as instituições públicas e privadas em detrimento do público, já que as corporações também se acercam da educação básica.
Em setembro acontecerá o 2° Encontro Nacional dos Educadores e Educadoras da Reforma Agrária (Enera), em Brasília. Como o Enera se insere nesta conjuntura?
Tenho uma expectativa muito positiva em relação ao segundo Enera. No primeiro Enera tivemos a constituição de outra perspectiva pedagógica para a educação brasileira, que foi a Educação do Campo, uma conceituação do que seria uma educação pública voltada para o campo, mas com um horizonte de formação humana que ultrapassa o campo.
Foi certamente uma proposta que promoveu sínteses brilhantes entre uma perspectiva crítica que vem do campo marxista, da ideia da escola unitária, do trabalho, ao compreender que o trabalho deveria ser um elemento simbólico, imaginativo, capaz de nos constituir como seres humanos, e que portanto a escola é o lugar da cultura, da arte, da ciência, da tecnologia, e não uma instituição livresca. É uma instituição que tem interação com o mundo, com a vida, com os processos de trabalho, com a produção real da cultura em diversos espaços, como pensar no que significa a agricultura no Brasil.
Foi uma proposta pedagógica que promoveu sínteses incorporando pensamento critico marxista, tradição latino-americana de educação popular, particularmente com Paulo Freire, e criou bases para um pensamento pedagógico socialista.
O segundo Enera, a meu ver, está desafiado pela conjuntura a fazer um balanço do que foi essa mercantilização e de como o capital está tentando se apropriar do conjunto da educação básica.
Ao fazer essa reflexão, certamente o Enera vai ajudar a criar bases para uma perspectiva de educação pública unitária capaz de contrapor a educação frente à lógica de movimentos empresariais como o Todos pela Educação.
Pode haver incorporações de elementos novos na nossa reflexão sobre a pedagogia socialista que respondam desafios da ofensiva do capital, mas sobretudo respondam os anseios que estão pulsando em todo o país em torno da educação pública.
Como as últimas greves na educação?
Podemos problematizar a fragmentação das lutas pela educação, o fato de que muitas vezes são lutas econômicas e corporativas, que estão vinculadas as políticas municipais e estaduais, mas não tenho dúvidas de que essas lutas que estão pulsando no país estão enfrentando aspectos dessa pedagogia do capital, criticando a meritocracia, a racionalidade das competências e dos sistemas centralizados de avaliação, o uso de cartilhas.
Temos críticas reais a essa lógica de controle que o capital está buscando sobre a educação básica, mas precisamos sistematizar isso com outros fundamentos pedagógicos, e aprofundando a experiência que foi construída a partir do primeiro Enera.
No segundo Enera acredito que novas dimensões para essa pedagogia socialista vão ser esboçados, e não como o resultado de um processo em que os especialistas de educação do MST vão se reunir e pensar o que seria essa agenda.
Ao contrário, como resultado de uma articulação de movimentos que estão fazendo educação pública e estão buscando uma educação criativa, que estão fazendo as lutas de resistências com as greves, mobilizações, com a participação de estudantes.
Esta riqueza de produções que estão em circulação nas lutas em defesa da educação pública que podem criar uma sistematização maior. Creia condições para que possamos ampliar esta aliança entre experiências da luta urbana com as que vieram do campo, produzindo novas sínteses e novas possibilidades para que a classe trabalhadora tenha sua própria agenda para o futuro da educação pública.
É um processo longo e exigirá um esforço organizativo e intelectual de enorme envergadura. Temos que ter uma produção pedagógica mais sistematizadas, mais profunda, para criarmos a base desse pensamento pedagógico crítico, que assegure uma formação integral, mas uma educação que recusa a divisão dos seres humanos em dois grupos: um que pensa e mando, outro que executa e obedece.
Essas bases para uma proposta socialista estão sendo gestadas nas lutas, mas com o ENERA podemos ganhar um momento de qualidade no terreno da elaboração, articulação e organização em defesa desse projeto de novo tipo.
Publicado originalmente em Brasil de Fato

A financeirização e as mutações do capitalismo do IHU

A financeirização e as mutações do capitalismo

Para Yann Boutang, a financeirização está transformando metodicamente um dos pilares do capitalismo, a relação assalariada, que também é uma das chaves da exploração nesse sistema

Por: Márcia Junges e Leslie Chaves| Tradução Vanise Dresch

Para além do econômico, a financeirização tem ampla influência na organização social, atingindo aspectos como a biosfera, “que diz respeito à produção do meio vivo em geral”, e a noosfera, “que cobre todas as atividades mentais, espirituais, culturais”. Segundo Yann Moulier Boutang, apesar de serem menos destacados, tais impactos são profundos. “A produção de conhecimentos novos, a aprendizagem por meio de conhecimentos e aquela, mais delicada, do vivente por meio do vivente, por levantar questões éticas cruciais, ampliaram tanto a esfera pertencente ao econômico, que ela colocou em crise os principais instrumentos de avaliação a que recorriam os economistas (o valor trabalho, o valor utilidade, a medida do tempo, da produtividade, a imputação a indivíduos ou a entidades como as empresas da inovação, da eficiência)”, aponta em entrevista por e-mail à IHU On-Line.
Diante desse cenário, o sistema capitalista tem sofrido modificações significativas em comparação com a estrutura que apresentava na era industrial. De acordo com o economista, a financeirização é simultaneamente o cerne dessas transformações e do capitalismo em si. 
Ao longo da entrevista, Boutang aborda os reflexos da financeirização nos diversos campos da vida em sociedade, como a relação com as Tecnologias de Informação e Comunicação como meio para pensar alternativas para a construção de uma sociedade mais comprometida com o bem comum. “Tenho grande confiança no desenvolvimento de uma política mais sintonizada com as necessidades de nosso tempo, porque a revolução digital, ao contrário da revolução industrial, nos conduz agora a uma fase da humanidade capaz de abolir o trabalho como maldição bíblica para passar à atividade coletiva como liberação do homo oeconomicus”, frisa.
Yann Moulier Boutang participou ativamente do movimento de 1968. Em 1973, conheceu Antonio Negri, de quem permanece parceiro intelectual. Em 1974, criou a revista Camaradas, que desenvolve os temas da “Autonomia Operária”, conceito adotado então na Itália por militantes procedentes do operariado. Camaradas é um dos primeiros grupos do movimento autônomo na França. Após a autodissolução da revista, Boutang participa, de 1979 a 1981, do Centro Internacional para Novos Espaços de Liberdade - CINEL, uma iniciativa de Félix Guattari. È redator chefe da revista política, artística e filosófica Multitudes. Atualmente é professor de ciências econômicas na universidade de tecnologia de Compiègne e professor no Centro Fernand-Braudel da Universidade de Binghamton-New York, EUA.
De sua vasta produção intelectual, destacamos: De l’esclavage au salariat. Économie historique du salariat bridé (Paris: PUF, 1998), Le droit dans la mondialisation: une perspective critique (Paris: PUF, 2002), Le capitalisme cognitif. La nouvelle grande transformation (Editions Amsterdam, 2007) e L'Abeille et l'Économiste (Paris: Carnets Nord, 2010).
Confira a entrevista.

IHU On-Line - Nos dias de hoje, quais são os impactos fundamentais da financeirização em nossa vida?
Yann Moulier Boutang - Vejo três tipos de impacto segundo a natureza dos setores afetados. A financeirização de tudo diz respeito, naturalmente, às atividades que chamaríamos de mercantis (comércio, indústrias manufatureiras, produção agrícola, indústrias culturais, indústrias financeiras como os seguros), mas ela imiscui-se também, de forma crescente, naquilo que a contabilidade nacional chama de setor não mercantil (gestão do Estado, das coletividades locais, das universidades, dos serviços públicos, entre os quais o da saúde, e das empresas). Mas há também um impacto talvez mais profundo e menos destacado que diz respeito à produção do meio vivo em geral (a biosfera planetária) e ao meio mais especificamente inserido no primeiro: a noosfera, que cobre todas as atividades mentais, espirituais, culturais. A produção, como já haviam pensado, faz muito tempo, os filósofos e os teólogos, não é somente a transformação da matéria, por meio da energia, pelo homo faber; ela abarca a geração das condições dessa produção: a linguagem, o corpo em boa saúde, a cultura e todos os laços que fazem de nós seres sociais. Hoje, porém, essa evidência acabou caindo no modelo reducionista da ciência econômica. A produção de conhecimentos novos, a aprendizagem por meio de conhecimentos e aquela, mais delicada, do vivente por meio do vivente, por levantar questões éticas cruciais, ampliaram tanto a esfera pertencente ao econômico, que ela colocou em crise os principais instrumentos de avaliação a que recorriam os economistas (o valor trabalho, o valor utilidade, a medida do tempo, da produtividade, a imputação a indivíduos ou a entidades como as empresas da inovação, da eficiência).

IHU On-Line - Em que medida o neoliberalismo é o fundamento, a base da financeirização?
Yann Moulier Boutang - Eu não colocaria as coisas nessa ordem. Pelo contrário, eu inverteria a ordem. O neoliberalismo, que, do liberalismo, só mantém o aspecto econômico, logo, o pior, porque logo se desembaraça do aspecto libertador dos direitos humanos, é apenas uma consequência subalterna, historicamente transitória, do regime de financeirização. Ora, a financeirização é, ela mesma, uma consequência da transformação profunda a que me referi na primeira resposta, e que resumo em minha tese do advento de um terceiro tipo de capitalismo, o capitalismo cognitivo. É porque o capitalismo descobriu o novo continente da polinização humana (da força produtiva das interações da multidão humana em sociedade), de trezentas a mil vezes mais produtiva que o antigo modo de produção dominado pelo modelo da mecânica, da energia de carbono, que ele precisa ampliar a finança, já inventada na era do mercantilismo, em Gênova, para cobrir o risco marítimo, a essa nova economia mundial. Em outras palavras, a multiplicação do crédito pelo mercado financeiro em relação aos fundos próprios (um coeficiente de alavancagem [leverage, em inglês] monetária de 30, em vez de 5) não é uma monstruosidade vinda do céu ou do inferno, e sim um pálido reflexo da descoberta de um novo Eldorado. Os GAFA  são os conquistadores do antigo mundo da economia industrial, embora seu evangelho seja bastante frustro (Don’t be evil de Google ) ou absolutamente desmedido em sua negação da finitude (a primeira versão do transumanismo californiano). Se a nova esfera da riqueza (e, portanto, do valor possível), como a polinização, vale, no mínimo, várias centenas de vezes o valor do Produto Interno Bruto - PIB comercial planetário, os antigos índices de multiplicador de crédito se tornam totalmente insuficientes para valorizar essa nova esfera, e os aprendizes de feiticeiro das salas de trading  dos bancos arremedam essa transformação fundamental. 
A finança é o governo par defaut  das externalidades positivas de polinização, e também das temíveis externalidades negativas de destruição de nosso oikos, nosso meio ecológico. O neoliberalismo imiscui-se nessa brecha aberta da antiga economia: ele permite avaliar, estabelecer tecnicamente um preço para o futuro e a massa em falta da economia (o continente das externalidades). Enquanto os Estados e a sociedade mundial não compreenderem o potencial produtivo da polinização humana, não medirem todas as consequências em matéria de valor (portanto, de prioridades), de novos e antigos bens comuns a serem instituídos, incentivados, protegidos em comum, em matéria de impostos, de regulação, o neoliberalismo prosperará como o único programa disponível. É nesse sentido que falo de um governo neoliberal par defaut, na acepção da informática: trata-se de um modo de governança ao qual recorre o sistema global, que tem horror do risco e da incerteza radical ainda mais, por falta de algo melhor. Fazer da finança e do neoliberalismo os inimigos número um e a última ratio da desordem na terra é praticar exorcismo obscurantista, é retardar a conscientização da realidade das transformações e dos potenciais libertadores que elas contêm, e da elaboração de políticas alternativas. 

IHU On-Line - Em que aspectos a pulsão de vida (e morte) do capitalismo, a acumulação, é um elemento importante para compreendermos essa financeirização?
Yann Moulier Boutang - Não gosto muito do uso do termo “pulsão de vida” ou, a fortiori, “pulsão de morte” para se referir a entidades que não sejam pessoas humanas e que não seja no plano psicanalítico. Além disso, não penso que a financeirização, outro nome do capitalismo (é seu cerne atual), seja suicida, nem dionisíaca, em relação à concepção apolínea e fria da racionalidade neoclássica. Enfim, ao contrário de certo marxismo vulgar mecanicista, a acumulação não é “a lei e os profetas” do capitalismo (o capitalismo mostrou, em sua história, ter sido capaz de destruir friamente quantidades gigantescas de capital físico e de capital intelectual quando seu poder esteve ameaçado — definido, como diz Foucault, como a capacidade de fazer com que alguém faça algo, no caso, os explorados). O capital e o capitalismo são uma relação social, uma relação, e não uma quantidade física de capital. Suas mutações, suas reações não são aquelas de um touro, nem de um patrão, tampouco somente as dos patrões coletivos. Acredito, como mostrou a escola operaísta, a meu ver, de maneira decisiva, que o capital como sistema complexo cujos agentes não passam de “trägers” (condutores) só é inteligível como reação e interação com o proletariado, a classe operária e, hoje, o mundo cognitivo ou das redes, a composição do capital intelectual vivo, e como controle dos impulsos e movimentos desse devir-classe, ele só pode ser compreendido como reação, retrocírculo, se assim podemos dizer, dentro dessa relação. Toda a história específica das relações (portanto, de força) capitalistas, as únicas que constituem o capital, o qual não é nem uma coisa nem dois atores preexistentes, só pode ser lida nessa dialética, e, além disso, com a opção metodológica, mais interessante do ponto de vista heurístico, de inverter as prioridades de ver, primeiramente, os movimentos a partir de baixo, para depois subir, em vez de partir dos níveis econômicos e técnicos do capital para deles deduzir o Estado, as classes sociais, os “subalternos”, logo, do economismo, que é um marxismo e um neoliberalismo igualmente vulgares. 
A realidade é mais simples e mais complexa ao mesmo tempo. Mais simples: o capitalismo como modo de produção, no momento em que parecia (apenas parecia) superar um antagonismo devido ao desaparecimento do “socialismo real”, deparou-se com um limite, o qual podemos chamar de morte, mas não uma pulsão de morte, e sim a morte do planeta, de nossa morada comum, a da biosfera. Essa manifestação cada vez mais nítida da consciência da finitude não dos indivíduos (ontogênese), mas do homo sapiens sapiens (filogênese), é a nova força que trabalha o par das relações de força das classes, o novo clinâmen [declinação], os antigos dominados e os sempre dominantes. Diante dessa emergência que, em economia, tem o nome de aumento do peso das externalidades negativas e positivas (estas últimas sendo pouco visíveis, ao contrário dos efeitos devastadores do crescimento capitalista), o governo da relação (a famosa governança) se expressa pela forma da finança e da financeirização, que permite incluir essas externalidades tanto para o bem como para o mal. A financeirização não é a pulsão de morte, ela é uma resposta “par defaut”, por falta (falta de alternativa), a essa finitude planetária e ao risco político que afeta a sobrevivência da relação capitalista, não mais do lado da exploração dos homens, mas do lado da exploração do planeta, que conduz à morte global. A finança em si mesma não é a pulsão de morte do capitalismo: ela representa sua forma de sobrevivência, de resiliência, portanto, é antes sua pulsão de vida, mas essa pulsão de vida está a serviço de uma relação que enfrenta agora, ela mesma, a questão da morte global da espécie na era do antropoceno. Ela pode ser qualificada de pulsão de morte somente em segundo grau, se considerarmos que a sobrevivência do capitalismo se dá em detrimento da sobrevivência global do mundo. E, por outro lado, no plano das externalidades positivas, trata-se mais de um instrumento que pode ser domesticado a serviço da vida global do planeta (financiando a transição ecológica e a despoluição dos resíduos nucleares e do lixo industrial que nos tornamos). 

IHU On-Line - Nesse cenário de financeirização, quais são os limites, desafios e possibilidades do capitalismo cognitivo?
Yann Moulier Boutang - A financeirização representa o triunfo desviado da consideração das externalidades, do invisível e do imaterial na produção pela humanidade de suas próprias condições de vida. Ela arremeda à sua revelia a força da polinização humana, única fonte verdadeira da riqueza (mas ainda não do valor), e a acuidade do risco ecológico maior no qual a hybris  capitalista mergulhou nosso planeta. Seus limites devem-se em larga medida ao seu poder de amplificação (que vemos nas bolhas financeiras infladas e rompidas) e de possibilidades de ganhos espetaculares, portanto, de acumulação de poder, que ela oferece à avidez, à cupidez humana quando se alia à inteligência. 
A financeirização é o braço armado, sinto-me tentado a dizer, da “nova grande transformação” que o capitalismo está efetuando, em detrimento do corpo do velho capitalismo industrial. Ela constitui, mais do que nunca, o cerne do capitalismo (aliás, ela sempre foi, como mostrou Braudel , o mercado sendo apenas uma consequência, uma fetichização quase religiosa de sua ordem, mas em um nível muito mais visível agora). 
Ao mesmo tempo, ela pode se tornar o melhor auxiliar para uma saída por cima, num sentido libertador, do capitalismo, o qual corresponde a um projeto historicamente datado de transformação do planeta. Ela está desgastando metodicamente um pilar, o pilar por excelência do capitalismo, a relação assalariada estável, que é também a chave do mecanismo da exploração.
A automação intelectual, com a robotização de múltiplos serviços graças à acumulação de big data  produzido pelos objetos conectados e às learning machines , está polarizando, reduzindo drasticamente o emprego (e até mesmo as relações convergentes na Europa e nos Estados Unidos, a tal ponto que já se prevê um aniquilamento dos empregos das classes médias nas próximas décadas) e, além disso, polarizando ao extremo o emprego entre, de um lado, tarefas pouco qualificadas, automatizáveis, ou tarefas de care  impossíveis de automatizar, e, de outro lado, tarefas muito qualificadas, inovadoras, inteligentes e rebeldes ao learning machines por serem singulares. 
Foi, em suma, o que Marx descreveu no texto mítico “Fragmentos sobre as máquinas”, nos Grundisse (São Paulo: Boitempo, 2011), que constituiu a base da reflexão operaísta nos anos 1960. O capitalismo, em seu centro, está abolindo o trabalho assalariado, retornando a uma atividade mercantil precária, sem cobertura social, sem proteção e, ao mesmo tempo, explorando socialmente a atividade não mercantil de polinização da interação comunicacional, linguística, científica, cultural, e até mesmo de fabricação nas fábricas digitais, nos fab labs . Com todo o potencial de revolta, de invenção de novos modos de vida e de relações produtivas alternativas. Toda essa nova transformação só será possível através de uma domesticação da finança de mercado, que representa algo totalmente diferente do que são as invocações rasas e piedosas a uma moralização do mercado, cujos limites pudemos avaliar oito anos depois da crise dos subprimes . Os novos resíduos bourbonianos, para usar as palavras de Keynes , não são mais o lastreamento da criação de crédito no ouro, mas a limitação dos investimentos em nome de uma austeridade absurda e, afinal, criminosa. 

IHU On-Line - Acredita que há uma hegemonia da economia sobre a política? Por quê?
Yann Moulier Boutang - A economia, dizia Lênin , é o político condensado. O atual primado de uma economia sobre as decisões de política econômica e sobre a moldagem da legislação (como o eterno aumento da flexibilização do mercado de trabalho) reflete duas coisas: a) a persistência de uma ideologia muito delimitada no tempo (entre 1950 e 1980, o monetarismo em particular) que, depois de ter conquistado posições universitárias sólidas, transformou-se em ideologia gerencial mais estatal; b) a resistência feroz da parte já subalterna da classe menos produtiva do capitalismo, e certamente não aquela do capitalismo cognitivo. Este está amplamente em guerra com os velhos setores reacionários do capitalismo industrial “bleu marine” [azul marinho] (jogo de palavras, em francês, que remete ao macacão azul usado pelos operários [bleu] e ao nome de Marine Le Pen, porque, hoje, mais de um quarto dos operários da indústria votam na extrema direita) em muitas áreas, entre as quais a “uberização” , a “googlelização”  são etapas em andamento. Ao cabo dessa nova grande transformação, a economia de produção terá sido infiltrada pela economia digital. A financeirização representa a liquidação e a liquidez da velha economia. O capitalismo cognitivo ainda não dispõe de uma economia política que lhe corresponda. Chegamos apenas ao novo quadro de Quesnay  dessa nova álgebra do valor econômico, e aqueles que refletem sobre as formas modernas de exploração, de servidão, sobre os novos vícios, as novas amarguras dessa economia que partiu rumo à conquista do céu, estão longe de terem criado novos instrumentos de luta e domesticação do dragão digital. 

IHU On-Line - Em termos gerais, é adequado analisar essa preponderância da economia sobre a política como um elemento explicativo do descrédito da política e da apatia dos eleitores?
Yann Moulier Boutang - É claro que a crise política reflete essa exasperação em relação a uma submissão beata ou muito tola das políticas às “leis da economia”, como se estas nos impusessem o famoso Tina de Margaret Thatcher (there is no alternative) . Os partidos conservadores, liberais, enfrentam uma situação revolucionária da economia. Tornam-se reacionários em querer retornar à era dourada industrial (que, aliás, foi extremamente árdua para os pobres, os humilhados e os ofendidos). Os partidos de esquerda comunistas e socialistas viram sucessivamente o comunismo entrar em colapso ou acabar no pesadelo de transições desvairadas para o pior do capitalismo liberal sem a democracia. O socialismo reduziu sua ambição (do modo como ainda a formulavam Jaurès , Blum , na França, ou a grande social-democracia alemã) a uma cogestão implícita de um capitalismo neoconservador moderado por uma preocupação de redistribuição limitada às classes médias. 
Em ambos os casos, a mola transformadora que fora a locomotiva do progresso e do modelo europeu, apesar de sua arrogância colonialista, rompeu-se. Uma pesquisa de opinião realizada em junho de 2015 mostra que 89% dos franceses não gostam dos partidos políticos. Os que se saem menos mal são os partidos com função “de tribuna”, como dizia Georges Lavau , isto é, contestadores, não gestores, como o Partido Comunista e, hoje, o Front National  (versão Jean-Marie Le Pen , o pai), seguido pelo centro e pelo Partido Verde, ambos marginais. O cenário europeu, no entanto, está mudando, com o crescimento de um populismo (desta vez, com governos como Erdogan, na Turquia, Orban, na Hungria, Marine Le Pen (filha), na França, o Skip party, no Reino Unido) que se expressa num soberanismo sem futuro, porque repousa em uma visão da economia que se mantém nacional num conjunto europeu cada vez mais federal de fato, mesmo que isso ainda não seja reconhecido. Felizmente, essa perspectiva pouco encorajadora é contrabalanceada pela saída institucional à esquerda, de Syriza , na Grécia, e de Podemos , cinco anos depois do movimento dos Indignados . Haverá uma conjunção, nos próximos anos, entre essas buscas de alternativas políticas reais para enfrentar o imobilismo das velhas receitas e para a renovação profunda da economia (via revolução digital) e, por fim, em último lugar, da economia que se encontra, hoje, na posição “ancilar”  da teologia na Idade Média e num papel extremamente conservador, para não dizer reacionário, que acabou assumindo no Renascimento.

IHU On-Line - Qual é o espaço e os limites da democracia nesse cenário?
Yann Moulier Boutang - A economia não pode mais limitar-se à economia mercantil e a um setor não mercantil público que repete todos os limites da economia mercantil. Ela tem de incluir as externalidades no cálculo econômico, isto é, aquilo que podemos usar como recursos, e em que condições. Isso, para salvar o planeta (a biosfera), que temos de transmitir aos nossos filhos e netos em um estado equivalente, no mínimo, àquele que recebemos (essa é a melhor definição do desenvolvimento sustentável). Para cumprir esse programa urgente e de uma complexidade temível, a economia deve apoiar-se na noosfera (toda a esfera da mente, da língua, da cultura) e cultivar a polinização das abelhas humanas e não os adubos químicos e os pesticidas (é fácil estabelecer uma comparação com a biosfera, os diversos psicotrópicos sendo os adubos químicos do cérebro humano, os pesticidas sendo o tratamento da loucura gerada por essa corrida em busca da produtividade, da exploração dos humanos). 
A revolução digital combinada com os saberes humanos, e não somente com a ciência, pode tornar-se o instrumento, o órgão de uma retomada pelas comunidades humanas de seu destino responsável. Ela pode ser não simplesmente a enésima oportunidade de “turbinar” os lucros, mas levar as sociedades complexas, históricas, globais a um aprofundamento radical da democracia. Desde que, obviamente, a horizontalidade das redes digitais não se feche em um novo poder aristocrático de especialistas, para depois se juntar ao poder oligárquico dos ricos. Desde que, também, se dote de novas instituições ou contrainstituições que redefinam a autoridade, dando-lhe um rosto humano (isso passará, certamente, por uma feminização maciça de um poder masculino demais e próximo demais dos chipanzés, em vez de prestar atenção no que acontece entre os bonobos !!), limitando-a por contrapoderes, descentralizando-a. 
Isso significa, por exemplo, não considerar qualquer recurso comum como sendo uma terra nullius, um domínio público do qual os interesses privados podem tirar proveito de forma inesgotável. Portanto, uma economia de partilha, um direito jurídico de sucessão sobre o status dos bens, uma preocupação com a reprodução do que é bem comum. Em suma, rever e reconstruir o interesse geral (Aristóteles), o que é o fundamento da política a partir do copyleft, de R.M. Stallman , das regras comunitárias de uso do meio de equilíbrio frágil, de Elinor Ostrom , da força produtiva das multidões (o pinguim do Linux, lembrado por Yoshai Benkler em The wealth of Networks (Londres: Yale University Press, 2007) ou por mim mesmo em L’abeille et l’économiste (Paris: Carnets Nord, 2010)). 

IHU On-Line - Que novas formas políticas surgem enquanto resistência e enfrentamento? Nessa lógica, como podemos compreender manifestações como o 15-M , o Occupy Wall Street , o Podemos, o Syriza e até mesmo os protestos de julho de 2013  no Brasil?
Yann Moulier Boutang - Tenho grande confiança no desenvolvimento de uma política mais sintonizada com as necessidades de nosso tempo, porque a revolução digital, ao contrário da revolução industrial, nos conduz agora àquele estágio descrito por Marx em “Fragmentos sobre as máquinas”, dos Grundisse (1857-58), que ia além, mas mantinha e destacava o Marx dos Manuscritos de 1844: o de uma fase da humanidade capaz de abolir o trabalho como maldição bíblica (segundo a interpretação agostiniana e puritana de uma consequência da saída do Paraíso) para passar à atividade coletiva como liberação do homo oeconomicus, governado apenas pelas duas libidos sentiendi e dominandi em detrimento da libido sciendi ou ludendi, bem menos funestas. 
Sou otimista, porque a conjunção de um estágio de desenvolvimento econômico com a ferramenta digital, a globalização cultural e, last but not least , o surgimento de uma necessidade e de uma urgência de trabalhar para a salvação da tribo humana, ligada à salvação da terra em geral, que pode unir “aqueles que acreditavam no céu e os que não acreditavam”, não nos coloca na situação muito mais difícil do Renascimento colonial, em que se mantinha “sua face sombria”, como ilustrou Walter Mignolo , ou então naquela dos “tenants” irlandeses que lutavam contra os landlords que os expulsavam das terras e os Parliamentary enclosures . Lembremo-nos do esforço dos jesuítas, quando criaram as Reduções, para salvar os ameríndios da escravidão, da servidão ao trabalho rural e, depois, industrial a que os colonos ávidos do Eldorado os destinavam. Esse esforço foi limitado pelo fato de que a economia mutualista, comunitária (a qual o movimento operário também voltou, diante da grande indústria manchesteriana), era muito menos eficaz e produtiva do que o acúmulo capitalista muito primitivo. Mas, desta vez, na era do Spätkapitalismus , o desenvolvimento, a produtividade e, além disso, a salvação comum do planeta estão do lado da desenclausuração, do modo e do código de produção peer to peer, seja mercantil ou não. 

IHU On-Line - Até que ponto é possível haver um “outro dinheiro”? Qual deveria ser seu real papel em nossas sociedades?
Yann Moulier Boutang - A preocupação dos homens ávidos por uma sociedade de justiça e esperança, portanto, utópica, no sentido definido por Arrigo Colombo , em seus belíssimos livros, de que ela ainda está por ser construída, sempre foi controlar o poder considerável do dinheiro. O dinheiro manda fazer. É a própria definição do poder sobre outrem; neste sentido, ele corrompe tudo, inclusive a si mesmo. A hostilidade das igrejas cristãs, muçulmanas e budistas à taxa de juros, ao desbridamento de sua área de extensão, não se deve a um capricho infantil. Mas o dinheiro também libera da dívida, do presente sufocante, quando toma a forma do crédito. Ora, esse crédito é a essência da moeda, que possibilita que uma sociedade se apoie numa antecipação do futuro de uma construção mais sólida. É um poder tão potente que, assim como a fé partilhada por uma comunidade pode mover montanhas, ele logo conheceu a apropriação por pessoas privadas ou pelos Estados, que regulamentam o direito de conceder crédito, o índice de juros praticado (definindo o que é usurário), as obrigações das partes contratantes. 
O monopólio da emissão de crédito ou do instrumento técnico de pagamento que vai traduzi-lo (a moeda metálica e, depois, fiduciária), do qual o comércio é apenas um aspecto, concentra um imenso poder. De maneira lógica, os homens, principalmente aqueles que tinham por que se queixar da distribuição das riquezas, procuraram libertar-se da coerção do poder por excelência, aquela que obriga os homens a fazerem um trabalho que gostariam de evitar, sobretudo, em detrimento de atividades que não rendem dinheiro. 
A organização das moedas alternativas contesta esse poder global do dinheiro, quebrando muitas vezes, de forma muito modesta, o monopólio de emissão de moeda e crédito. As diversas tentativas de moedas locais enfrentaram, em geral, uma repressão feroz das autoridades, que viam nessas tentativas um risco de contestação do Estado e da organização da sociedade e da produção determinadas sobre as quais ele se alicerçava. Mais uma vez aqui, o desenvolvimento do caráter de interdependência global da produção das condições de existência pelas sociedades, a possibilidade, graças à ferramenta digital, de organizar uma contabilidade das atividades humanas complexas, a ferramenta das comunicações em tempo real pelos telefones móveis conectados à internet mudam consideravelmente o alcance das moedas locais. 
Quando o Banco Central do governo equatoriano (apesar de muito vigiado pelo FED  americano, uma vez que a moeda deste país é dolarizada) implementou um sistema de pagamento por telefone móvel entre os pequenos agentes econômicos, essencialmente na zona rural, sem que estes tivessem de passar pelos bancos (o governo precisou resolver problemas técnicos de segurança informática, apoiar-se numa rede de vendedores ambulantes nas cidades), ele mostrou que os bancos não são uma instituição eterna e que poderiam ter um papel consideravelmente reduzido. Em outro registro, o surgimento e o sucesso fulgurante do crowdfunding  e do crowdlending  — estes, em economias desenvolvidas — mostram que uma economia mais eficiente, menos devoradora de recursos, menos produtora de renda é possível. Em suma, que moedas locais articuladas com a economia pilotada em seu conjunto, inclusive nos agregados da liquidez ou da quase liquidez do crédito, não conduzem absolutamente ao rompimento do laço social.

IHU On-Line - Em que sentido é possível falarmos em outra economia num contexto marcado pela hegemonia do dinheiro e do mercado financeirizado?
Yann Moulier Boutang - Se a financeirização da economia expressa o fato de que a finança de mercado atual é o governo “par défaut” do crescimento cada vez mais efetivo e esmagador das externalidades tanto positivas como negativas, isso não quer dizer que outra economia além da mercantil e traduzida em moeda sonante não seja possível. Isso quer dizer, ao contrário, que enquanto a esfera não financeira da economia e a economia política não levarem em conta essas externalidades, na medida de seu crescimento na riqueza real e no potencial de valor, a finança será cada vez mais solicitada e terá muito com o que se ocupar. 
Quando formos capazes de criar outro programa de pilotagem dessa economia global, a programação “par defaut” se imporá, com seu cortejo de defeitos evidentes. A finança, com seus vícios — que são consideráveis —, tem hoje, infelizmente, a virtude (e é a única, considerando-se a pusilanimidade dos Estados) de criar liquidez para financiar o futuro (principalmente, na área da transição energética, que é uma urgência estratégica). Somente ela tem o poder de gerar 32 bilhões de dólares de crédito disponibilizados imediatamente a partir de um pequeno bilhão de fundos próprios. Cabe aos Estados e, sobretudo, às grandes comunidades internacionais (Impérios, Organização das Nações Unidas - ONU, Fundo Monetário Internacional - FMI) agir mais, e o poder da finança (que não é somente um estado de fato, mas também, nas cabeças dos políticos, insuperável) voltará a proporções mais razoáveis e menos perigosas.

IHU On-Line - Qual é o cenário que se vislumbra para os próximos anos nas economias emergentes, como a do Brasil e de outros países da América Latina?
Yann Moulier Boutang - Não sou especialista em economia da América Latina em geral, tampouco do Brasil em particular. Então, tome a minha resposta com cuidado. Os BRICS , com exceção da Rússia, emperrada ainda numa descolonização que levará trinta anos para se completar, deparam-se todos com a questão do futuro da China, que é determinante para eles, tanto no sudeste asiático e na África, como na América Latina. Esses países compartilham com a China alguns dos problemas estruturais que condicionam a consolidação de sua saída do subdesenvolvimento ou, melhor dizendo, do mau desenvolvimento, sem disporem das vantagens estratégicas que a China adquiriu em trinta anos. Brasil, Índia, China e África do Sul (acrescentemos a Nigéria, o México, a Indonésia) devem simultaneamente ampliar a base de suas classes médias, portanto, ampliar a renda destas, seja aumentando os salários, seja redistribuindo pela criação de um Estado de bem-estar social efetivo, e não no papel, para terem um nível de consumo interno que torne seu PIB menos dependente das exportações de produtos de baixo ou médio custo, de recursos energéticos poluentes e, ao mesmo tempo, para continuarem a obter excedentes de sua balança de pagamentos e de sua balança comercial, investirem em equipamentos de futuro em indústrias e serviços de alta tecnologia, se não quiserem permanecer enredados na armadilha de uma perda de competitividade de suas exportações devido à má qualidade ou baixa integração de conhecimento, à concorrência de países onde os salários são ainda mais baixos, à corrupção que encarece o preço e não estimula os assalariados nem o setor público de infraestrutura a fazerem um esforço de produtividade. Uma das soluções para esses dilemas seria a ampliação maciça da base e da solidez das classes médias, erradicando de maneira muito mais voluntarista os fatores de desigualdades, portanto, estendendo o equivalente de uma renda de cidadania ou de educação (no modelo do Bolsa Família, que teve, no Brasil, um efeito notável sobre o índice de Gini  em um período muito curto), dotando suas economias de um sólido Welfare state  (especialmente, nas áreas da educação superior, da saúde, dos equipamentos urbanos) e focando no desenvolvimento das classes criativas precárias (não a camada superior delas). Mas essa estratégia passaria por um aumento das despesas públicas que não aprofundaria necessariamente, de maneira insuportável, o endividamento se medidas drásticas de economia fossem tomadas em relação às despesas suntuosas com mínimos efeitos de mudança duradoura (como, por exemplo, os esportes e outros eventos dignos da Roma antiga com seu “pão e seus jogos”), acompanhadas também por despesas com aparato militar. Também seria preciso levar a sério a transição ecológica, apostar na construção de uma indústria verde, em vez de obstinar-se em projetos que desembocarão num prazo de dez anos em ruínas siderúrgicas ou mineiras com consequências catastróficas para o meio ambiente, em particular, no caso brasileiro, para a Amazônia e também para o Mato Grosso do Sul. 
O desenvolvimentismo agrícola ou industrial pesado, que, na era digital, parece de outra era, sempre custou muito caro para o Brasil, que não soube capitalizar fases de desenvolvimento rápido, o ciclo madeireiro do pau-brasil no século XVI, o ciclo abortado do trigo paulista no século XVII, o ciclo das pedras preciosas no século XVIII, o ciclo abortado do algodão no início século XIX, o ciclo da cana de açúcar do século XVIII ao XX, o ciclo do café, o ciclo abortado da borracha do fim do século XIX à década de 1930. Os ciclos da soja transgênica, da carne de búfalo, da floresta amazônica, do petróleo do pré-sal não são uma garantia do desenvolvimento. Não criam nenhum efeito mágico. As verdadeiras questões do bem viver da maioria da população, da inclusão dos pobres, amontoados nas cidades, em condições precárias de transporte, moradia, higiene e segurança são cruciais. Em outras palavras, a questão da redução das desigualdades, as quais ainda atingem os níveis característicos dos países em desenvolvimento, como programa econômico, junta-se à questão de um desenvolvimento menos dependente das exportações, ecologicamente mais sustentável e mais apto a tornar o Brasil, e os BRICS em geral, mais armado na concorrência internacional, na economia do conhecimento. 
A China e a Rússia, diferentemente do Brasil, enfrentam dificuldades muito semelhantes. Se esses dois países não têm as desvantagens de uma real democracia, que traz incerteza para os investidores e para a possibilidade de conduzir políticas de longo prazo, eles também não têm as vantagens dela, o que constitui uma séria deficiência na corrida ao capitalismo cognitivo que se inicia no mundo. A cultura digital (que nada tem a ver com uma experiência e competências em eletrônica e em informática) está estreitamente ligada à democracia. Desse ponto de vista, o Brasil pode inspirar-se mais proveitosamente em Bangalore, na Índia, do que em Shenzen, na China. 

IHU On-Line - Dentro da lógica neoliberal e da financeirização, como podemos compreender acordos comerciais do tipo feito entre os governos do Brasil e China há pouco tempo?
Yann Moulier Boutang - Faz muito tempo que a China desenvolve uma estratégia, em relação ao antigo bloco, hoje bem desconjuntado, do Terceiro Mundo, tanto na África quanto na América Latina, de abastecer-se nesses países em produtos semimanufaturados, principalmente agrícolas, em energia e em recursos minerais, em troca do fornecimento de contratos turn key  de bens de equipamento, a exemplo do que fazia a Alemanha oriental comunista. Em outras palavras, a América Latina corre o risco de trocar sua antiga dependência do gigante americano por uma nova dependência da China. O fenômeno é ainda mais gritante na África subsaariana. Se tais projetos de equipamento em infraestrutura acompanham uma política de desenvolvimento endógeno de aumentar a qualidade da população sul-americana, por que não? No entanto, há de se temer que, limitando-se a construir autoestradas, pontes, ferrovias transamazônicas, depois de ter construído estádios para diversas copas de futebol, a América Latina inteira tenha crescimento sem desenvolvimento social e com uma fatura ecológica cara, como se tivesse o recheio, mas não o peru para rechear. 
Se a China consegue incluir o Brasil em acordos comerciais importantes, isso acontece por duas razões: a) ela assume o lugar deixado vago tanto pelos Estados Unidos quanto pela Europa, que não garantiram aos argentinos nem aos brasileiros uma colocação segura na alimentação de seu gado para uma soja não transgênica; b) a China acumulou uma força financeira colossal (3,7 trilhões de dólares de reservas em divisas estrangeiras em 2015), o que lhe permite emprestar sob forma de crédito-arrendamento (créditos ligados a importações de produtos chineses industriais) aos outros BRICS. Ela conseguiu criar recentemente seu próprio FMI, sob a forma do Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura, dotando-o de 500 bilhões de dólares e convidando os outros membros participantes a aportarem mais 500 bilhões. Esse programa deseja criar uma rota da seda do Sul, paralela àquela do Norte, que se concretizará com um trem-bala (ou TGV) de 11.000 km entre Pequim e Moscou. 
A China carrega a Índia, levada a substituí-la como “fábrica do mundo”. Ela venderá, nesse tipo de imperialismo soft, sua tecnologia de construção, sua mão de obra qualificada, seus bens de equipamento, entre os quais o trem-bala, o que lhe permitirá ultrapassar o delicado patamar em que agora se encontra: dotar-se de um welfare state, acolher 400 milhões de camponeses em 200 cidades de 2 milhões de habitantes, responder aos desafios ecológicos gigantescos que o país enfrenta (seca, erosão do solo cultivável, poluição química), requalificar sua indústria para o alto padrão, investir nas indústrias de ponta para poder continuar aumentando os salários, mantendo ao mesmo tempo um excedente de sua balança comercial, mesmo que este seja reduzido. O acordo sino-brasileiro insere-se perfeitamente nesse contexto de uma estratégia chinesa, de cujas deficiências não trataremos aqui. Em compensação, podemos nos perguntar se o Brasil tem uma estratégia tão coerente e, sobretudo, compatível com seu parceiro chinês. Por certo, trata-se de um acordo apresentado como win/win (os dois lados ganham). Porém, duas questões surgem: a) os ganhos para a China são incomparáveis com os ganhos brasileiros; b) se acrescentarmos os custos sociais, ambientais e de coerência industrial no desenvolvimento, não se tem certeza de que os ganhos comerciais sejam realmente ganhos. No entanto, mais uma vez, a China procura seu lugar de grande potência nas relações mundiais e o encontra, em grande parte, por causa do vazio europeu e americano.■
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A bioprodução. “O capitalismo cognitivo produz conhecimentos por meio de conhecimento e vida por meio de vida”. Entrevista com Yann Moulier Boutang publicada na revista IHU On-Line nº 216, de 23-04-2007;
“O sistema financeiro de mercado é como o sismógrafo desta crise”. Entrevista com Yann Moulier Boutang publicada na revista IHU On-Line nº 301, de 20-07-2009.