quinta-feira, 8 de maio de 2014

Um novo balanço de Junho

Um novo balanço de Junho



Michael Hardt pergunta, em livro sobre revoltas de 2013: “Como
movimentos atuais, organizados na forma da multidão, podem tornar-se
duradouros e efetivos contra poderes dominantes?”



Por Michael Hardt




Esse texto é prefácio do livro Amanhã vai ser maior: o levante da multidão no ano que não terminou, que terá seu lançamento* em São Paulo na quinta-feira 8/05, no Auditório 333 da PUC-SP as 19h30.






Inspirado por três dias de barricadas e insurreição nas ruas de
Paris, em junho de 1848, Karl Marx escreveu que o “leão proletário”
tinha se levantado e rugido. O proletariado parisiense revoltoso foi
rapidamente vencido, mas a sua face sombria e ameaçadora chegara à cena
da história. Nas “jornadas de junho” brasileiras, em 2013, a multidão
mostrou a sua face de modo semelhante. Embora não tenha vencido
imediatamente, este leão também pode anunciar notícias sobre nosso
futuro.








Dizer que as revoltas surgidas nas ruas de Rio e São, em 2013,
foram organizadas na forma da multidão significa dizer que, – em vez de
dirigidas pelo partido ou uma direção centralizada ou mesmo um comitê de
liderança acima das massas, – os movimentos foram auto-organizados,
conectados horizontalmente pelo território social. Os movimentos não
foram (e não se esforçam por ser) unificados e homogêneos, mas sim
encontraram meios adequados para exprimir suas diferenças e antagonismos
internos – e apesar de (ou por causa de) suas diferenças, descobriram
maneiras de troca comum e cooperação, gerando uma série de demandas e
perspectivas agrupadas na luta. Tal multidão não é desorganizada e não
se forma espontaneamente, ao invés disso, ela requer uma atividade
constante e intensa de organização.


A multidão no Brasil – como na Turquia, Espanha e em todos os lugares
do ciclo de lutas que se alonga desde 2011 – exige uma “democracia
real”, contra a democracia fantoche que nos vendem o tempo todo. É, de
fato, uma ideia bonita. Mas estariam as lutas políticas da multidão,
apesar de explodir ruidosamente em cena, condenadas a ser fugazes e
efêmeras, inefetivas contra os poderes dominantes? A falta de unidade e
liderança central minaria qualquer consequência política duradoura para
as lutas da multidão? Seria a vida dessa multidão “sem liderança” cheia
de barulho e de fúria, mas sem significar nada? Ou, ao contrário, seria a
força da multidão como o “leão proletário” de Marx: embora
temporariamente subjugado e aparentemente domado, uma força selvagem que
só vai ser verdadeiramente reconhecida no futuro?


Antes de abordar essas questões, devemos enfatizar duas condições
políticas e sociais contemporâneas que proveem o terreno sobre o que
surge as revoltas da multidão.

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