sexta-feira, 23 de maio de 2014
domingo, 18 de maio de 2014
quinta-feira, 8 de maio de 2014
Um novo balanço de Junho
Um novo balanço de Junho
Michael Hardt pergunta, em livro sobre revoltas de 2013: “Como
movimentos atuais, organizados na forma da multidão, podem tornar-se
duradouros e efetivos contra poderes dominantes?”
Por Michael Hardt
–
Esse texto é prefácio do livro Amanhã vai ser maior: o levante da multidão no ano que não terminou, que terá seu lançamento* em São Paulo na quinta-feira 8/05, no Auditório 333 da PUC-SP as 19h30.
–
Inspirado por três dias de barricadas e insurreição nas ruas de
Paris, em junho de 1848, Karl Marx escreveu que o “leão proletário”
tinha se levantado e rugido. O proletariado parisiense revoltoso foi
rapidamente vencido, mas a sua face sombria e ameaçadora chegara à cena
da história. Nas “jornadas de junho” brasileiras, em 2013, a multidão
mostrou a sua face de modo semelhante. Embora não tenha vencido
imediatamente, este leão também pode anunciar notícias sobre nosso
futuro.
Dizer que as revoltas surgidas nas ruas de Rio e São, em 2013,
foram organizadas na forma da multidão significa dizer que, – em vez de
dirigidas pelo partido ou uma direção centralizada ou mesmo um comitê de
liderança acima das massas, – os movimentos foram auto-organizados,
conectados horizontalmente pelo território social. Os movimentos não
foram (e não se esforçam por ser) unificados e homogêneos, mas sim
encontraram meios adequados para exprimir suas diferenças e antagonismos
internos – e apesar de (ou por causa de) suas diferenças, descobriram
maneiras de troca comum e cooperação, gerando uma série de demandas e
perspectivas agrupadas na luta. Tal multidão não é desorganizada e não
se forma espontaneamente, ao invés disso, ela requer uma atividade
constante e intensa de organização.
A multidão no Brasil – como na Turquia, Espanha e em todos os lugares
do ciclo de lutas que se alonga desde 2011 – exige uma “democracia
real”, contra a democracia fantoche que nos vendem o tempo todo. É, de
fato, uma ideia bonita. Mas estariam as lutas políticas da multidão,
apesar de explodir ruidosamente em cena, condenadas a ser fugazes e
efêmeras, inefetivas contra os poderes dominantes? A falta de unidade e
liderança central minaria qualquer consequência política duradoura para
as lutas da multidão? Seria a vida dessa multidão “sem liderança” cheia
de barulho e de fúria, mas sem significar nada? Ou, ao contrário, seria a
força da multidão como o “leão proletário” de Marx: embora
temporariamente subjugado e aparentemente domado, uma força selvagem que
só vai ser verdadeiramente reconhecida no futuro?
Antes de abordar essas questões, devemos enfatizar duas condições
políticas e sociais contemporâneas que proveem o terreno sobre o que
surge as revoltas da multidão.
ir ao link principal
Michael Hardt pergunta, em livro sobre revoltas de 2013: “Como
movimentos atuais, organizados na forma da multidão, podem tornar-se
duradouros e efetivos contra poderes dominantes?”
Por Michael Hardt
–
Esse texto é prefácio do livro Amanhã vai ser maior: o levante da multidão no ano que não terminou, que terá seu lançamento* em São Paulo na quinta-feira 8/05, no Auditório 333 da PUC-SP as 19h30.
–
Inspirado por três dias de barricadas e insurreição nas ruas de
Paris, em junho de 1848, Karl Marx escreveu que o “leão proletário”
tinha se levantado e rugido. O proletariado parisiense revoltoso foi
rapidamente vencido, mas a sua face sombria e ameaçadora chegara à cena
da história. Nas “jornadas de junho” brasileiras, em 2013, a multidão
mostrou a sua face de modo semelhante. Embora não tenha vencido
imediatamente, este leão também pode anunciar notícias sobre nosso
futuro.
Dizer que as revoltas surgidas nas ruas de Rio e São, em 2013,
foram organizadas na forma da multidão significa dizer que, – em vez de
dirigidas pelo partido ou uma direção centralizada ou mesmo um comitê de
liderança acima das massas, – os movimentos foram auto-organizados,
conectados horizontalmente pelo território social. Os movimentos não
foram (e não se esforçam por ser) unificados e homogêneos, mas sim
encontraram meios adequados para exprimir suas diferenças e antagonismos
internos – e apesar de (ou por causa de) suas diferenças, descobriram
maneiras de troca comum e cooperação, gerando uma série de demandas e
perspectivas agrupadas na luta. Tal multidão não é desorganizada e não
se forma espontaneamente, ao invés disso, ela requer uma atividade
constante e intensa de organização.
A multidão no Brasil – como na Turquia, Espanha e em todos os lugares
do ciclo de lutas que se alonga desde 2011 – exige uma “democracia
real”, contra a democracia fantoche que nos vendem o tempo todo. É, de
fato, uma ideia bonita. Mas estariam as lutas políticas da multidão,
apesar de explodir ruidosamente em cena, condenadas a ser fugazes e
efêmeras, inefetivas contra os poderes dominantes? A falta de unidade e
liderança central minaria qualquer consequência política duradoura para
as lutas da multidão? Seria a vida dessa multidão “sem liderança” cheia
de barulho e de fúria, mas sem significar nada? Ou, ao contrário, seria a
força da multidão como o “leão proletário” de Marx: embora
temporariamente subjugado e aparentemente domado, uma força selvagem que
só vai ser verdadeiramente reconhecida no futuro?
Antes de abordar essas questões, devemos enfatizar duas condições
políticas e sociais contemporâneas que proveem o terreno sobre o que
surge as revoltas da multidão.
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Negri e nós |
Negri e nós |
Em
nosso tempo, as categorias e instituições políticas características da
“modernidade” estão em crise. Democracia, representação, partidos,
sistemas de welfare,
nada parece escapar à “fadiga dos materiais” que contamina até as
propostas de reforma que se apresentam. Mesmo as rebeliões e
insurgências metropolitanas dos últimos anos, apesar do potente desejo
de liberdade e igualdade que expressam, encontram limites que frustram a
construção de instituições e práticas alternativas. A tragédia das
revoluções do século XX, entre 1917 e 1968, malgrado os aspectos
positivos que legaram, parece se projetar sobre todos os esforços de
transformação que temos testemunhado.
nosso tempo, as categorias e instituições políticas características da
“modernidade” estão em crise. Democracia, representação, partidos,
sistemas de welfare,
nada parece escapar à “fadiga dos materiais” que contamina até as
propostas de reforma que se apresentam. Mesmo as rebeliões e
insurgências metropolitanas dos últimos anos, apesar do potente desejo
de liberdade e igualdade que expressam, encontram limites que frustram a
construção de instituições e práticas alternativas. A tragédia das
revoluções do século XX, entre 1917 e 1968, malgrado os aspectos
positivos que legaram, parece se projetar sobre todos os esforços de
transformação que temos testemunhado.
Como
ultrapassar essa angustiante situação? Como evitar que a potência
constituinte dos oprimidos seja aprisionada nas jaulas do constituído?
Como impedir que a ação política seja reduzida ao simulacro da
representação? Como pensar a constituição de um sujeito político que
escape à tentação do Uno e à tutela de vanguardas? O que pode nos
ensinar todo um acúmulo de derrotas?
ultrapassar essa angustiante situação? Como evitar que a potência
constituinte dos oprimidos seja aprisionada nas jaulas do constituído?
Como impedir que a ação política seja reduzida ao simulacro da
representação? Como pensar a constituição de um sujeito político que
escape à tentação do Uno e à tutela de vanguardas? O que pode nos
ensinar todo um acúmulo de derrotas?
Se
temos a sensibilidade marcada pelo amor à vida e por uma irrenunciável
solidariedade em relação aos que vivem e padecem as privações e
humilhações que nascem da desigualdade e da servidão; se ousamos pensar a
política a partir do antagonismo que opõe inconciliavelmente os
pequenos que desejam se liberar aos grandes que desejam oprimir; se
desejamos construir comunidade a partir do respeito às singularidades e
do reconhecimento da multiplicidade dos modos de viver, sentir, pensar e
produzir; se tomamos o capital como relação violenta de comando e
exploração sobre os que trabalham – então podemos compreender o que há
em comum entre Antonio Negri e nós.
temos a sensibilidade marcada pelo amor à vida e por uma irrenunciável
solidariedade em relação aos que vivem e padecem as privações e
humilhações que nascem da desigualdade e da servidão; se ousamos pensar a
política a partir do antagonismo que opõe inconciliavelmente os
pequenos que desejam se liberar aos grandes que desejam oprimir; se
desejamos construir comunidade a partir do respeito às singularidades e
do reconhecimento da multiplicidade dos modos de viver, sentir, pensar e
produzir; se tomamos o capital como relação violenta de comando e
exploração sobre os que trabalham – então podemos compreender o que há
em comum entre Antonio Negri e nós.
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