segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Fábrica ocupada en Grecia comienza la producción bajo control obrero. Ocupar, resistir, producir! | Alasbarricadas.org

Fábrica ocupada en Grecia comienza la producción bajo control obrero. Ocupar, resistir, producir! | Alasbarricadas.org
"Vemos esto como el único futuro para las luchas obreras."
Makis Anagnostou, vocero del sindicato de trabajadores de Vio.Me
El Martes, 12 de febrero 2013 es el primer día oficial de producción bajo control obrero en la fábrica de Viomichaniki Metalleutiki (Vio.Me) en Tesalónica, Grecia. Esto significa  producción sin jefes y sin jerarquía, organizada a través de las asambleas de los trabajadores con procedimientos de democracia directa. La asamblea de los trabajadores ha declarado el fin de la distribución desigual de los recursos, y ha decidido colectivamente establecer una remuneración equitativa y justa. La fábrica produce materiales de construcción, y los trabajadores han declarado su intención de cambiar progresivamente la producción hacia productos inofensivos para el medio ambiente.
"Mientras el desempleo sube al 30%, los ingresos de los trabajadores llegan a cero, hartos de palabras, promesas y más impuestos, sin recibir sueldos desde mayo de 2011 y actualmente en retención de su trabajo, con la fábrica abandonada por los dueños, los trabajadores de Vio.Me. por decisión de su asamblea general declaran su determinación de no caer en un estado perpetuo de desempleo, sino luchar para tomar la fábrica en sus propias manos y operarla por sí mismos. Ha llegado el momento para el control obrero de Vio.Me.! "(Declaración de la Iniciativa Abierta de Solidaridad, escrita junto con los trabajadores de Vio.Me - declaración completa en viome.org)
Los trabajadores de Vio.Me dejaron de ser pagados en mayo de 2011, y, posteriormente, los propietarios y administradores abandonaron la fábrica. Después de una serie de asambleas los trabajadores decidieron que juntos volverán a poner la fábrica en funcionamiento. Desde entonces, han ocupado y defendido la fábrica y la maquinaria necesaria para la producción. Han diseminado su mensaje a los demás trabajadores y comunidades en todo Grecia, recibiendo un enorme apoyo. La solidaridad y el apoyo de todos estos grupos, comunidades e individuos, ha contribuido de manera importante a la supervivencia de los trabajadores y sus familias hasta el momento.
Esta experiencia de ocupación y recuperación de empresas de parte de los trabajadores no es nueva. Desde 2001 hay alrededor de 300 lugares de trabajo que operan  democráticamente bajo control obrero en Argentina, desde centros de salud, periódicos y escuelas, hasta fábricas de metal, talleres de impresión y un hotel. La experiencia ha demostrado que los trabajadores juntos no sólo pueden operar su propio lugar de trabajo, sino que pueden hacerlo mejor. El ejemplo de Argentina se ha extendido por todo el continente americano, y ahora también por Europa y los EE.UU. En Chicago, los trabajadores de New World Windows han comenzado la producción bajo control obrero después de años de lucha contra los antiguos propietarios y jefes. Ahora en Grecia, los trabajadores están demostrando una vez más que el camino a seguir – saliendo del desempleo, superando la crisis - es el control obrero y la autogestión por procedimientos de democrácia directa.

" Instamos a todos los trabajadores, los desempleados y todos aquellos que se ven afectados por la crisis a confraternizarse con los trabajadores de Vio.Me y apoyarlos en sus esfuerzos por poner en práctica la creencia de que los trabajadores pueden producir sin jefes! Les instamos a emprender la lucha y a organizarse dentro de sus propios lugares de trabajo, con procedimientos democráticos directos, sin burócratas. "(del sitio web del sindicato www.biom-metal.blogspot.gr).
Al igual que con todas las recuperaciones de fábricas, la cuestión de la financiación inicial es central. Mientras que el movimiento de solidaridad ha sido capaz de apoyar a los trabajadores de Vio.Me y sus familias, el capital necesario para continuar la producción es enorme. El sindicato de trabajadores tiene un plan de negocio sostenible, pero se necesitará tiempo para que este dé frutos. Los primeros meses serán decisivos. La ayuda económica puede hacer la diferencia. Cualquier contribución es útil.
Pueden enviar apoyo económico directamente al sindicato de trabajadores de Vio.Me. de Tesalónica a través del sitio web de solidaridad internacional: viome.org
Declaraciones de solidaridad, así como preguntas pueden ser enviadas a: protbiometal@gmail.com
Firmado,
Iniciativa de Solidaridad de Tesalónica, Brendan Martin (La Base), Dario Azzellini y Marina Sitrin

Esta iniciativa está apoyada por:
David Harvey, Naomi Klein, Avi Lewis, John Holloway, Silvia Federici, George Caffentzis, David Graeber, Mag Wompel (labournet.de) y Cooperativa de Trabajo Lavaca, Buenos Aires, Argentina

O longo ano que começou em Junho | Das Lutas

O longo ano que começou em Junho | Das Lutas
Por Maurício Campos – Militante da Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência
“Os grandes acontecimentos revolucionários possuem a particularidade de que, por mais que tenham sido antecipados e esperados, não obstante tão logo se produzem, apresentam-se diante nós, em sua complicação e sua configuração concreta, como uma esfinge, como um problema que é preciso compreender, indagar-se e apreender-se em cada uma de suas fibras.”
(Rosa Luxemburg, “A Revolução na Rússia (I)”, primeiro de uma série de artigos escritos imediatamente após o início da revolução de 1905 no Império Russo. Em Obras Escogidas, vol. 1, Ediciones Era, México, 1978)
Desde o Caracazo venezuelano de 1989, pelo menos, as explosões de rebeliões populares “descontroladas” no mundo têm me fascinado. Aos poucos foi se firmando em mim a compreensão de que, no mundo pós-Guerra Fria, pós-URSS e pós-apartheid, tais rebeliões, não só espontâneas como muitas vezes confusas e enigmáticas, eram não obstante a forma concreta pela qual os explorados e oprimidos do mundo podiam avançar na resistência e possível derrocada revolucionária do sistema capitalista mundial.
Opinião certamente herética segundo a maior parte da esquerda ortodoxa, mas a partir dela escrevi e me referi repetidamente a tais rebeliões, desde os levantes negros em Los Angeles de 1992, passando pelo Argentinazo de 2001, a revolta das banlieues francesas em 2005, a Comuna de Oaxaca em 2006, etc.
Claro que tal “obsessão” continha e estimulava também a esperança que explosões semelhantes acontecessem no Brasil mais cedo ou mais tarde. Há algum tempo já havia me tornado descrente de que os partidos de esquerda e movimentos sociais mais tradicionais do Brasil pudessem iniciar alguma movimentação de massas com potencial revolucionário. Por outro lado, já valorizava e participava dos “novos movimentos” que se multiplicavam no vácuo de luta e consciência que partidos e movimentos como o PT e a CUT, e depois os governos por eles hegemonizados, haviam criado.
Mesmo assim, por mais que me dedicasse a vários desses “novos movimentos”, sempre pensei que em alguma hora haveria que acontecer o famoso “salto de qualidade”, que unisse tantas lutas e resistências fragmentárias em algum tipo de levante de massas, sem o qual as perspectivas revolucionárias de tais movimentos pioneiros ficariam muito restritas.
Em junho desse ano essa esperança acalentada durante tantos anos começou a concretizar-se. O júbilo (não consigo encontrar outra palavra para descrever meus sentimentos) foi tão grande que a última coisa que pensei foi escrever sobre os levantes populares. Ir às ruas, aos confrontos, às barricadas, registrar e divulgar tudo isso, era o que mais importava. Ainda acho que, no fundo, é o que importa. Mas a advertência de Rosa na epígrafe acima também é fundamental. É preciso enfrentar a esfinge, com as ferramentas analíticas que exigem tempo, foco, reflexão, e se expressam muito melhor na escrita.
Não tenho certeza se tal análise já seja plenamente possível. A voragem não acabou, temporadas rebeldes ainda assomam no horizonte. Mas vi tantas “análises” apressadas e disparatadas feitas por gente que não só não participou, como assumiu uma posição quase hostil frente aos levantes, e isso me parece que obriga a quem mergulhou nas lutas desde o início, e não se abalou com muitas coisas realmente estranhas que aconteceram, a também deixar seus rabiscos como contribuição.
Era óbvio?
Seguindo um padrão de “análises de conjuntura” supostamente marxista, muitos buscaram compilar dados econômicos e sociais que mostrassem uma situação deveras insuportável que explicasse uma explosão tão inesperada de gentes na rua. Certamente chamaram a atenção para coisas relevantes, como a péssima qualidade dos serviços públicos no país e outras realidades que, de toda forma, estão longe de ser novidade.
A vida sob o capitalismo não tem como não ser insuportável, se levarmos em conta todo seu desenvolvimento histórico e sua extensão mundial. Toda a arte de dominação das oligarquias mundiais consiste precisamente em obrigar os dominados a suportarem o insuportável. O que tem que ser explicado é como e quando falha essa arte dos dominadores.
Os levantes de junho no Brasil de forma alguma podem ser colocados na mesma categoria, quanto às suas motivações iniciais, que o Caracazo, o Argentinazo, ou mesmo as revoltas árabes e os movimentos europeus que se sucedem desde 2008. Nestes casos, havia uma situação econômica bastante exasperante empurrando massas do povo para o protesto de rua.
Entretanto, muitos outros levantes pelo mundo não precisaram de uma conjuntura econômica particularmente dramática para acontecer. A brecha no cotidiano de dominação pode nascer de conflitos sociais localizados amadurecidos ao longo do tempo até chegarem ao ponto de ruptura. Assim foi em Los Angeles em 1992, em Oaxaca em 2006, na França em 2005 ou no Chile nos últimos anos, por exemplo.
Aproximaram-se mais de uma “explicação” quem buscou as raízes da revolta na deterioração acelerada da mobilidade urbana nos últimos anos no Brasil, que se liga a uma série de outros conflitos urbanos que tem se agravado em função do próprio “boom” econômico da última década. Assim fez, por exemplo, Ermínia Maricato em entrevista na edição especial da revista Fórum de julho de 2013 (n. 124, ano 12). Segundo ela, “uma das coisas que era óbvia para todo mundo era a condição de vida insuportável das cidades brasileiras”.
Como já disse, dizer que a vida sob o domínio do capital é insuportável é de fato bastante óbvio, mas isso não explica nada. Se era tudo tão “óbvio”, porque não foi previsto? Ok, tudo bem, exigir previsão é demais, ciência social não é bola de cristal. Mas porque a grande maioria destes pensadores que vieram com análises tão bem elaboradas sobre as “crises” que motivaram a revolta, em geral NUNCA apoiaram os movimentos, invariavelmente não institucionalizados, que atuam sobre os conflitos urbanos há muito tempo?
A própria Ermínia Maricato nunca foi muito próxima dos movimentos pautados pelas ações diretas e de rua em São Paulo, como o MPL (Movimento Passe Livre) e o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), e sempre orientou-se por aqueles “movimentos” mais institucionalizados, pautados por co-administrar projetos de alcance reduzido numa parceria espúria com o poder público, em fóruns que sugam a energia militante dos ativistas enquanto a crise urbana se agrava. Sua miopia política permanece, quando classifica de “bom” o discurso de Dilma em junho, no auge dos protestos, quando fez promessas vagas que não tiveram grande desdobramento até hoje. Segundo Maricato, foi positivo que Dilma “não ficou falando de baderna”, mas ela falou sim de “vandalismo” e não citou nem uma única vez a questão da brutal repressão policial às manifestações.
“Falta uma pauta”
O problema geral das análises que se concentram nas ditas “causas objetivas” dos levantes repentinos é conduzir a um raciocínio que deprecia os elementos de consciência e organização presentes em quaisquer lutas que durem mais que um par de horas. Assim, “espontâneo” vira sintoma de algo puramente reflexo, como se as massas do povo reagissem de maneira puramente animal às tais “causas objetivas”. Tal como na social-democracia do século passado, criticada por Rosa Luxemburg, esse tipo de visão só considera “organizado” o que se enquadra nos partidos e sindicatos adaptados à disputa rotineira das eleições e dos acordos coletivos.
A crítica ao “espontaneísmo” das manifestações manifestou-se igualmente na afirmação de que, após a derrubada dos aumentos das tarifas em 19 e 20/06, “faltava uma pauta” ao movimento para que a energia de tantas pessoas nas ruas simplesmente não se dissipasse. Tal crítica partiu indistintamente tanto da “direita” (a grande imprensa e figuras públicas da velha oligarquia) como da “esquerda” (o PT e aliados e também a esquerda de oposição), e foi imediatamente seguida por uma sucessão de tentativas de impor uma certa “pauta” aos protestos. Quer dizer, ao se dizer “falta uma pauta” se queria dizer na verdade “sigam minha pauta”!
As oligarquias mais tradicionais (a “direita” histórica) propuseram de forma totalmente oportunista uma “pauta” moralista, abstratamente anti-corrupção, aproveitando-se do sentimento difuso de repúdio ao sistema político apodrecido que existia e existe entre as pessoas. Tiveram um êxito inicial, porém muito breve, mesmo assim isso ajudou a dar base a certas análises apressadas de que “a direita havia se apoderado dos protestos” (voltarei a isso). Já as novas oligarquias representadas pelo PT e movimentos associados responderam conclamando a uma reunião em torno da “pauta” apresentada por Dilma em seu pronunciamento ainda em junho, principalmente a “reforma política”, que pudesse incluir até uma nova constituinte.
Ambas tentativas fracassaram, e é possível que muitos vejam nisto a razão para os atos terem perdido o caráter massivo nos meses seguintes (até outubro, no Rio de Janeiro). Mas a verdade é que, ainda em junho, nos protestos que continuaram até o final da Copa das Confederações, a “pauta” geral que a maior parte das pessoas na rua abraçou, além do repúdio à repressão brutal (também voltarei a esse ponto fundamental), foi a exigência de serviços públicos decentes, principalmente na saúde e na educação, exigência intimamente associada à denúncia dos gastos absurdos nos estádios e outras estruturas visando a Copa de 2014 e (no Rio) as Olimpíadas de 2016. Pauta essa cultivada por anos a fio por movimentos sociais de base e incompatível com os interesses das oligarquias velhas e novas.
E está longe de ser uma pauta genérica e mal-definida. Claro que nem todo manifestante saberia indicar com exatidão quais medidas ou reformas propõe para se conquistar serviços públicos acessíveis e de qualidade, mas sempre foi assim em movimentos verdadeiramente de massas. Os detalhes dos “programas” e das reivindicações são de domínio dos militantes mais ativos e dedicados (ou dos “dirigentes”, nos movimentos mais hierarquizados), mas isso não nega sua organicidade. Uma enorme multiplicidade de movimentos e grupos têm realizado encontros, produzido literatura militante e traçado programas de reivindicações nas últimas décadas, e isso forneceu a base para a continuidade das mobilizações quando, a partir de julho, os grandes atos deram lugar a milhares de lutas e protestos menores e mais fragmentados.
Que revolução?
Essa fragmentação, claro, serviu para um outro tipo de crítica do tipo “falta uma pauta”, dessa vez por parte de setores de esquerda anti-sistêmicos que lamentaram os protestos não adotarem suas propostas e “programas” revolucionários. Criticava-se (e critica-se) o fato dos movimentos não adotarem uma postura “claramente socialista” e buscarem explicitamente “a derrocada do Estado burguês”.
A questão toda aqui é se existe hoje “clareza” em algum lugar sobre como desestruturar o Estado, ultrapassar o capitalismo e construir uma nova sociabilidade melhor, igualitária e livre. Vivemos já há algumas décadas uma época de transição histórica profunda, na qual os grandes movimentos anti-sistêmicos estruturados desde o século XIX ou mesmo antes (socialismo, anti-colonialismo e suas numerosas variantes) chegaram aparentemente ao seu apogeu sem destruir definitivamente o sistema mundial capitalista, embora modificando-o profundamente. As estratégias de revolução concebidas ao longo do século XX encontram-se todas em crise, o que não tem um aspecto puramente negativo.
Tais afirmações não querem dizer que vejo tudo como uma indefinição tão grande que não haveria hoje caminhos ao menos para se tentar decifrar os rudimentos de novas estratégias revolucionárias globais. Muita coisa já está sendo pensada e formulada nesse sentido, em todo o mundo. Não cabe aqui aprofundar, pois ficaria um texto extremamente longo, mas quero dizer que eu também tenho buscado nesse sentido já faz algum tempo. Em 2002 escrevi um texto bastante pesado e que eu mesmo acho difícil de ler, com um título meio pedante (“A construção da estratégia é a chave para a vitória revolucionária”), e que circulou somente para um número restrito de pessoas (nas referências bibliográficas acadêmicas seria mimeo), o qual citarei algumas vezes mais adiante, e no qual traço um conjunto bastante amplo de questões que podem servir de roteiro auxiliar para uma elaboração estratégica, mas há poucas conclusões. Posteriormente, diversos aspectos refinei, revisei e aprofundei em outros escritos, mas ainda não há muitas conclusões. Não vejo como ser diferente atualmente, é necessário um processo bastante árduo de aproximações, que só podem ser feitas se mergulhamos sem receio no turbilhão das revoltas espontâneas que se sucedem em todo mundo.
Portanto não vejo como criticar os protestos e os movimentos do levante brasileiro por não terem “clareza revolucionária”. O que podemos “exigir”, de um ponto de vista anti-sistêmico, é que os novos movimentos sejam fiéis aos seus próprios postulados radicais.
Vejamos o exemplo do MPL, que tem em sua carta de princípios a definição anticapitalista. Pode-se questionar, com alguma razão, que esse anticapitalismo, na prática, se expressa apenas em metodologias organizacionais (horizontalidade, independência, etc) e não se fala claramente em abolição da propriedade privada dos meios de produção e das relações mercantis, fundamentos do capitalismo nas relações econômicas. Contudo, o programa do MPL, no seu campo específico de atuação, tem como bandeira “emergencial” a tarifa zero para os transportes coletivos urbanos, que é incompatível com relações de mercado. No mínimo, a tarifa zero introduz, caso o serviço concreto – valor de uso – do transporte continuasse a ser prestado por empresas privadas, uma tensão insuperável entre o Estado subsidiador e o capital em busca de lucro máximo.
Mas o programa do MPL não pára na tarifa zero. Sua carta de princípios coloca como objetivo “uma outra lógica de transporte”, “um transporte gerido pelo interesse dos trabalhadores. Não as empresas, os políticos ou os técnicos que devem definir como deve funcionar. Quem tem autoridade para dizer como o sistema de transporte vai ser administrado é quem o utiliza todo dia” (declarações de Caio Martins, ativista do MPL/SP, na reportagem “Por uma vida sem catracas”, na já citada edição especial da revista Fórum de julho). Uma rota de luta claramente incompatível com o capitalismo.
Mas não há como ser anticapitalista numa luta específica pois o capitalismo é um sistema global, reclamarão os revolucionários socialistas ortodoxos. Sim, mas se cada movimento persiste no seu radicalismo e se todos se encontram na insurreição, essa limitação se supera, na prática, como deve ser, e não na pura teoria.
Essa discussão se aplica igualmente aos movimentos que combatem as chamadas “opressões específicas”, como os movimentos feministas, LGBT, etc (os movimentos anti-racistas têm um estatuto e um significado um tanto diferente; no Brasil, são muito mais “gerais” que “específicos”, falarei deles mais adiante), e que não por acaso tiveram um espaço destacado nos protestos desse ano. Muitas vezes se produz uma crítica “de esquerda” a tais movimentos porque eles não levariam em conta o “sistema como um todo”, não adotariam, junto com suas pautas específicas, um “programa revolucionário geral”, etc. Bem, tais movimentos, se forem radicais (radicalmente anti-machistas, anti-homofóbicos, anti-criminalização das drogas, etc) serão anti-sistêmicos, anti-capitalistas. E a superação das suas “particularidades” não é uma questão a ser resolvida teoricamente, mas praticamente, na prática do levante, da insurreição.
Partidos, de vilões a vítimas e vice-versa
Relacionada às criticas de “falta de pauta” e “falta de clareza revolucionária”, está a crítica aos protestos por manifestarem uma tendência “violentamente” anti-partidos. É uma crítica bem mais especificamente “de esquerda”, proveniente da esquerda partidária, é claro. A oligarquia brasileira tradicional, com seus partidos de direita já profundamente desgastados, concluiu que era oportuno se aproveitar do sentimento anti-partido para buscar atacar a “esquerda” governista e a extrema-esquerda oposicionista através do discurso difuso da anti-corrupção. E a extrema-direita fascista resolveu finalmente se expor e partir para a tática skinhead de comprar briga de rua com a extrema-esquerda partidária. Ganharam as brigas mas erraram o alvo, falarei disso mais adiante.
Seja como for, essa explosão de truculência fascista, se aproveitando do sentimento anti-partido, foi o momento mais confuso dos protestos. Ouvi companheiros profundamente desolados falarem que “havíamos sido derrotados”, “a direita tomou conta dos protestos”, “o fascismo está crescendo”, etc. Muitos se retiraram das manifestações. E até movimentos apartidários que estavam na linha de frente desde o início vacilaram e quase recuaram. Foi muito estranho. Mas foi só um momento.
A esquerda partidária, é claro, trata a posição anti-partido como um erro simplesmente. Atribuem-na a uma campanha sorrateira da grande imprensa e à inconseqüência do “anarquismo”. A extrema-esquerda partidária reconhece a contribuição que o oportunismo e a degeneração política do PT, PCdoB e outros deram a tal sentimento, mas insiste que se trata de uma “falsa lógica, segundo a qual todos os partidos são iguais, daí a rejeição” (declaração de Ivan Valente, deputado federal do PSOL, na reportagem “Os Descontentes Políticos”, na edição n. 196, junho de 2013, da revista Caros Amigos). Essa posição aproxima-se curiosamente de certo discurso da grande imprensa segundo o qual o problema do sistema político da democracia representativa liberal estaria simplesmente nos desvios “de corrupção”.
Outra parte da extrema-esquerda partidária, aquela que participa de eleições mas não tem praticamente nenhuma expressão eleitoral, e contra a qual acusações de corrupção são bem frágeis (a não ser para certas utilizações escusas da máquina burocrática dos sindicatos), centra suas críticas, por sua vez, na “inconseqüência” do anarquismo/autonomismo. Diante disso, o historiador da USP Lincoln Secco, na mesma reportagem “Os Descontentes Políticos” perguntou com razão: “Mas se um partido teria sido mais eficiente do que o MPL então por que nenhum dos partidos disponíveis de extrema esquerda foi seguido pelas ‘massas’?”
Na mesma edição da Caros Amigos, na entrevista “A tarefa é fortalecer as lutas sociais”, o militante do MTST/SP, Gabriel Simeoni, aproximou-se de uma resposta ao afirmar que “se alguém aparecer com alguma bandeira de algum partido, seja do PT, do PSOL, do PSTU ou do PCO numa manifestação, soa como oportunismo eleitoral, não é uma aversão aos partidos, é uma aversão às eleições”. Sim, mas é um pouco mais que isso. Não só grupos de partidos, mas inclusive grupos de movimentos como o MTST e o MST, por exemplo, também foram hostilizados, embora não participem de eleições, é óbvio. Entretanto, na estética dos protestos, pareciam-se com as colunas partidárias por comportarem-se com uma certa “uniformidade” de bandeiras (quase sempre vermelhas), e às vezes de bonés e camisetas. A grande maioria dos manifestantes fugia conscientemente dessa uniformidade, e mesmo sendo “massa” (no sentido de quantidade), e exatamente por serem multidão revelarem sua potência nas ruas, cada pequeno grupo ou manifestante fazia questão de marcar sua individualidade carregando sua própria faixa e seu cartaz, revivendo inclusive a técnica básica da cartolina e hidrocor, uma das marcas registradas dos protestos de 2013.
Essa divergência estética reflete também uma diferença de ação política. As faixas e cartazes dos manifestantes “não-uniformizados” não reproduziam siglas, símbolos ou logotipos de partidos ou movimentos, mas tinham cada uma sua própria mensagem, reivindicação, crítica, sarcasmo, desabafo, enfim, essa explosão de criatividade popular que foi um dos tantos milagres de um ano tão miraculoso.
Abro aqui parênteses. Não acredito que “uniformes” sejam algo totalmente ultrapassado e inútil na luta social anti-sistêmica. Mas penso que sua utilidade se reduz cada vez mais à sua função original na técnica bélica/militar: identificar com a maior precisão possível quem é amigo e quem é inimigo no campo de batalha. Muitos grupos que nos protestos empenhavam-se nos confrontos com a polícia usaram muito eficientemente bandeiras com esse propósito. A própria tática black bloc, longe de ser puro esteticismo (como já ouvi várias vezes), em parte é uma recuperação dessa função primordial do uniforme. Fecha parênteses.
O “desgaste” dos partidos é parte da exaustão dos processos políticos dominantes desde o século XIX, o que inclui mas não se resume aos mecanismos eleitorais da democracia representativa. O que vemos em todo mundo é uma demanda incontida de participação direta nas decisões públicas, um repúdio veemente às oligarquias, elites, hierarquias e “direções” que buscam monopolizar as escolhas políticas que dizem respeito à toda sociedade através de mecanismos opacos e pouco compreensíveis à grande maioria das pessoas. Nem a representação através de eleições periódicas com sufrágio universal, o máximo que a elite capitalista ocidentalizada do mundo aceita como “participação”, dá conta disso. Os partidos, parte inseparável desse sistema capenga, entram em crise irremediavelmente porque, sejam eleitorais ou não, reacionários ou revolucionários, concebem-se e existem como instrumentos de poder distintos dos organismos de poder não concentrado ou hierarquizado, que potencialmente criam o que chamamos poder popular.
Essa não é uma posição que assumo de forma oportunista, embriagado pelos acontecimentos deste ano. A reformulação profunda da visão que eu tinha dos partidos já tem bem mais de uma década, e a parte final do texto mimeo de 2002 do qual já falei mais acima (“A construção da estratégia…”) é dedicada somente a isso, inclusive com uma resenha histórica resumida sobre a evolução da concepção de partido revolucionário. Acho que até vale a pena divulgá-la como artigo em separado, mas por enquanto cito apenas um trecho, que também serve para mostrar que, quem repudia a organização partidária, não necessariamente repudia a construção de organizações militantes reunindo pessoas com objetivos revolucionários:
“A completa superação da concepção da organização militante como instrumento de poder é essencial para a construção conseqüente de organizações revolucionárias e para um trabalho que leve as organizações de lutas de massas a se tornarem órgãos de poder popular. Contudo, se abandonamos essa concepção, não existe mais nenhuma justificativa para chamarmos as organizações militantes de partidos. Não se trata de um expediente tático, pelo fato do termo ‘partido’ estar desgastado ou coisa parecida, mas uma inevitável conclusão conceitual. As organizações militantes revolucionárias do proletariado surgiram como ‘partidos’ porque concebiam-se desde o início como instrumentos de poder. Continuaram chamando-se ‘partidos’, por longo tempo, porque embora desmentida pela experiência histórica, a concepção delas como instrumentos de poder ressurgiu e consolidou-se através das complexas experiências de derrotas e retrocessos das revoluções proletárias dos séculos XIX e XX. Se tirarmos as corretas conclusões de toda esta história, só podemos concluir que estamos nos livrando com muito atraso desse inadequado termo ‘partido’.”
“Direita” e “vandalismo”
Lembro de uma reunião, ainda em junho, na qual participei, onde se debatia calorosamente se os protestos tinham um caráter emancipador, progressista, ou ao contrário seriam reacionários e até mesmo “fascistas”. Intervi dizendo que, em algo tão grande como uma autêntica insurreição popular, e a reação contra-revolucionária que a segue, é inevitável que o melhor e o pior que existe na sociedade se revele, se exponha, mas que isso não pode nos levar a perder o foco.
Entres os candidatos a “pior da sociedade” que se revelaram a partir de junho, duas coisas bem diferentes se destacaram: os grupos, bandeiras e reivindicações de extrema-direita; e a violência contra bens materiais e, em escala bem menor, pessoas ligadas ao aparato político e policial.
A súbita irrupção das sombras fascistas atordoou a esquerda e os movimentos sociais, mas foi pouco evidenciada pela grande imprensa. Mas no fundo não revelou nada de novo. Grupos fascistas têm proliferado meio silenciosamente no Brasil já há algum tempo, e nunca foram de fato confrontados pelos movimentos progressistas. Esse crescimento na penumbra política foi, na verdade, muito favorecido pela vergonhosa conciliação que marcou a transição da ditadura civil-militar para a “democracia” nos anos 80 do século passado, e que deixou intocados tanto o essencial do aparato repressivo da tirania (polícia militar e civil, oficialato das forças armadas, justiça militar separada, órgãos de inteligência e monitoramento dos movimentos populares, etc) quanto os crimes de tortura, desaparecimento forçado e assassinatos cometidos por mais de 20 anos quando a extrema-direita esteve abertamente controlando o poder de Estado.
Por outro lado, já há alguns anos uma insidiosa afirmação de reivindicações ultra-conservadoras, como a redução da maioridade penal e a grita por endurecimento penal em geral, retorno do ensino religioso nas escolas públicas (do qual se favorecem as religiões cristãs, hegemônicas, é claro), definição de leis “anti-terroristas” e outras que apontam para o renascimento da idéia de “segurança nacional”, combinam-se com a repetição de atos e movimentos abertamente racistas, sexistas e homofóbicos. Mas tudo isso acontece de forma contraditória, pois ao mesmo tempo há uma afirmação crescente e pública, como não se via há muito tempo, de visões e movimentos que desafiam de forma muito aberta os padrões cristãos/ocidentais/masculinos/repressores dominantes, e que em alguns casos conquistaram marcos institucionais importantes. O que se observa, portanto, é muito mais uma polarização entre posições neo-conservadoras e progressistas, que o fortalecimento indiscutível do atraso. Mais um sinal de tensões sociais crescentes na sociedade brasileira.
O aparecimento disso tudo na rua foi, assim penso, algo no fundo positivo, pois obrigou a “cair a ficha” de muita gente. Mostra que as forças da mudança precisam se organizar e se mobilizar muito mais, e não se acomodarem com pequenos avanços na lei ou com a multiplicação de pesquisas acadêmicas progressistas, por exemplo. Mas de modo nenhum mostrou uma força irresistível da extrema-direita. Sua pujança sumiu quando resolveu convocar atos exclusivamente em torno de suas bandeiras moralistas e por “mais segurança”, grandes fracassos. Aqui no Rio, não conseguiram nem mesmo polarizar a massa católica de “peregrinos” durante a Jornada Mundial da Juventude para massacrar uma minoritária mas significativa Marcha das Vadias. Os bandos fascistas que agrediram militantes de partidos e movimentos, por sua vez, logo se retiraram de cena e voltaram a atuar exclusivamente no seu habitat natural, os aparatos repressivos do Estado.
O chamado “vandalismo”, por sua vez, é algo de fato novo nas lutas sociais no Brasil. Não que atos de depredação material, quebra-quebras e resistência massiva à repressão policial nas ruas fossem inexistentes (em algumas ocasiões houve quebradeiras realmente grandiosas, como a dos ônibus no centro do Rio em 1987), mas a novidade esteve na permanência do desafio à repressão policial mesmo com tanta brutalidade. Manifestantes rapidamente desenvolveram táticas de defesa e ataque para sustentar confrontos durante horas nas ruas, algo que apenas as batalhas entre vendedores ambulantes (camelôs, marreteiros, etc) ou torcedores de futebol, e a polícia (Choque da PM e Guarda Municipal) haviam tenuemente antecipado em algumas cidades brasileiras. Barricadas, cercos, incêndios direcionados, movimentação rápida de manifestantes, todas essas técnicas em muito pouco tempo tornaram-se comuns nos protestos. O medo de enfrentar a polícia, se não desapareceu, enfraqueceu-se de maneira notável. É um dos fatos mais significativos da insurreição popular de junho, um marco nas lutas populares no Brasil. E é mais um milagre de 2013.
O ataque midiático ao “vandalismo” tornou-se por sua vez o centro da disputa pela opinião pública tanto por parte da direita tradicional como da esquerda institucionalista, que assim se revelaram afinadas e aliadas na defesa da ordem questionada pelas ruas. Centrando fogo em ações sem dúvida desnecessárias e contraproducentes, mas bastante minoritárias, como a destruição de pontos de ônibus ou bancas de jornais, tentaram colocar a opinião popular contra ações inteiramente legítimas, do ponto de vista do protesto popular contra uma ordem injusta, como o bloqueio de ruas, barricadas e ataques contra símbolos do grande capital (bancos e sedes de grandes empresas) e do Estado (assembléias e palácios). Tentaram e ainda tentam, mas não foram bem sucedidos até agora. O maior símbolo de seu fracasso, ainda que parcial, foi a inesquecível imagem do Datena (apresentador sensacionalista da TV Bandeirantes) sendo surpreendido ao vivo pela aprovação popular, numa enquete em tempo real que ele tentou manipular, aos “protestos com baderna”. Tenho essa cena gravada e sugiro que a assistam todos que se sintam um pouco deprimidos com as dificuldades da conjuntura…
O “vandalismo” nos protestos foi acusado, de forma grotesca, como motivador da repressão e dos “excessos” da PM (como se algumas vidraças quebradas justificassem atingir os olhos de jornalistas e manifestantes com balas de borracha ou sufocar pessoas – inclusive causando sua morte – com quantidades absurdas de gás lacrimogênio e spray de pimenta, sem falar nos espancamentos) e, assim, por ter “afastado das ruas” milhares de “manifestantes pacíficos”. Mas, mesmo admitindo que foi assim, o que para mim é muito questionável, quem se afastou? E porque?
Uma resposta pode ser sugerida assistindo-se a um dos melhores documentários “ninja” produzidos sobre o protesto, Com Vandalismo (Nigéria Filmes). Percebe-se aí que os manifestantes “pacíficos” e “vândalos” diferenciam-se não apenas pela forma de se manifestar (“pacífica” ou “violenta”) mas também pela origem/posição de classe (os “vândalos” são majoritariamente proletários bem pobres, enquanto os “pacíficos” tendem a ser de classe média mais remediada) e pelos posicionamentos sociais e políticos (o discurso dos “vândalos” é notadamente mais radical e exige mudanças sociais mais profundas). Então, se o “vandalismo” realmente esvaziou os atos (eu penso que foi a repressão estatal que o fez) foi num sentido de torná-los mais radicalizados e mais “populares” (no sentido de “proletários”).
Os papéis tanto da “direita” como do “vandalismo” ficaram muito claros no grande protesto do dia 20/06 na Pres. Vargas no Rio de Janeiro. A extrema-direita fascista se organizou para emboscar os partidos de esquerda e alguns movimentos nas imediações da Candelária (próximo à rua Uruguiana), a massa “cara pintada” convocada pela Globo ficou entre a Candelária e a Central, aproximadamente, e os manifestantes mais radicais (incluindo um grande número de jovens das favelas da região central do Rio) se dirigiram para o início da avenida buscando a direção da Praça da Bandeira e do Maracanã (onde transcorria a partida entre Espanha e Taiti pela Copa das Confederações, lembro bem porque assisti a partida com meus filhos e amigos no estádio e abrimos duas grandes faixas em apoio à Aldeia Maracanã durante o jogo). Essa massa radicalizada entrou em confronto com o imenso aparato policial, detonando uma repressão tresloucada da PM, que perseguiu pessoas por todo o centro do Rio e áreas próximas noite adentro. A essa altura a extrema-direita e os cara-pintadas, com suas bandeiras conservadoras, já haviam se retirado da cena, e não mais voltaram às ruas com a mesma força. Já a parte mais à esquerda e radicalizada, ainda que confusa e com contradições, voltaria à rua pelo resto do ano, aperfeiçoando progressivamente a maneira de combinar os momentos “pacíficos” e “violentos” dos protestos.
“Classe média” e “proletários”, ou “brancos” e “favelados”
Essa questão do “vandalismo” nos então leva a duas outras questões decisivas e relacionadas: a dita “composição de classe” dos protestos e o desmascaramento do caráter brutalmente repressor, racista e burguês do Estado brasileiro. Começarei pela primeira.
Tornou-se rapidamente senso comum a afirmação de que os protestos foram iniciados e sempre dominados por uma classe média urbana, branca, instruída e politizada; e que a participação da “classe trabalhadora” ou da “favela” era secundária ou subordinada. Essa afirmação quase sempre era feita com uma carga negativa, e a mesma depreciação se aplicava à juventude da grande maioria dos manifestantes. Na reportagem “Das redes às ruas” da já citada edição n. 196 da Caros Amigos, o filósofo e cientista político da UFRJ Wanderley Guilherme dos Santos, exemplo de opiniões alarmistas sobre as conseqüências das manifestações (que para ele seriam simplesmente um golpe da direita parecido com 1964), diz: “É um besteirol imenso ficar festejando a juventude. No meu tempo de juventude tinha altruísmo, mas o futuro que a minha geração de idealistas construiu é esse que está aí”.
É muito comum pessoas que na juventude participaram de lutas importantes, mas depois se afastaram de qualquer movimento importante nas ruas, não compreenderem e menosprezarem as novas batalhas travadas pelos jovens. Mas felizmente há os que permanecem jovens na vontade e no inconformismo, como os senhores que protagonizaram uma das mais belas cenas dos protestos, ao levarem uma faixa onde se dizia “a geração de 1968 apóia a geração de 2013”! A generosidade e conseqüência desses senhores é bem ilustrada pelo artigo de Mouzar Benedito na já citada edição especial da revista Fórum, “Aprende-se a fazer fazendo”. Ele compara as formas de comunicação, a improvisação e o enfrentamento com a repressão de 1968 com as de 2013, e mostra que apesar das grandes diferenças há muito mais pontos de contato e convergências. Os jovens de hoje também percebem isso: no protesto de 17/06 aqui no Rio uma das palavras de ordem mais bradadas foi “um, dois, três, quatro, cinco mil; essa é a nova passeata dos 100 mil”!
Sou de uma geração posterior à de 1968, mas na minha juventude (a partir dos 15 anos aproximadamente) participei das lutas finais contra a ditadura, desde as passeatas pela Anistia até as Diretas Já, e das lutas sociais radicalizadas dos anos 80, que culminaram nas greves gerais de 1989 e 1990. Estive ao lado dos jovens de hoje em 2013, inclusive nas barricadas e confrontos, e posso afirmar, ao contrário do filósofo da UFRJ, que encontrei neles altruísmo e camaradagem, pelo menos na mesma medida que havia entre meus companheiros e amigos de 1978 a 1989.
Como em 2013, no início dos protestos, as manifestações de 1968 eram quase inteiramente constituídas por jovens estudantes, que na época eram muito mais de classe média do que hoje. Mas isso não os impediu de se tornarem a vanguarda de lutas radicalizadas e anti-sistêmicas, inclusive da luta armada contra a ditadura. E não representavam “a” classe média como um todo (que se beneficiou largamente do boom econômico sob a ditadura nos anos 70), mas a parte minoritária que se identificava com a situação dos trabalhadores mais pobres e buscava lutar junto a eles.
Não conseguiram. A aliança entre os movimentos de estudantes e as greves “selvagens” de Osasco e Contagem não foi adiante. A brutal repressão militar (tanto sobre estudantes como sobre operários) teve um papel nisso, bem como alguns erros das organizações clandestinas construídas pelos jovens, mas o principal problema foi que não se consolidou um importante movimento dos trabalhadores mais pobres, em especial os negros e moradores de favelas e periferias.
Tal como em 1968, o “problema” hoje não é a juventude nas ruas ter origem na classe média, mas que essa juventude consiga se juntar à vida e à luta dos mais explorados e oprimidos, os trabalhadores, os camponeses, os moradores de favelas e periferias e os sem-teto, o povo negro e os indígenas, um conjunto que, mais por comodidade que por definição sociológica, chamarei de “proletariado”. Não é um problema simples, mas determinadas condições permitem-nos ter esperanças que o desfecho será melhor que em 68.
Primeiro, algumas condições “objetivas”. Atualmente existe, tanto em números absolutos como proporcionalmente, muito mais estudantes universitários de origem proletária que há 45 anos atrás. Eles constituem uma “ponte” natural entre os dois mundos. E também existe hoje um verdadeiro movimento de base nas favelas e periferias (para não falar dos camponeses, quilombolas, indígenas, etc), ainda com muitas deficiências e contradições, é certo, mas real.
Em segundo lugar, uma condição “subjetiva”, quase um “sentimento”. A juventude dos protestos, mesmo aquela que não é da Baixada, de São Gonçalo, do subúrbio e das favelas, tem hoje uma facilidade muito maior em conhecer e se articular com o proletariado. Falo por experiência direta: conheci desde junho muitos jovens da Zona Sul ou de partes ricas da Zona Norte que em muito pouco tempo se aproximaram dos movimentos de favelas e estabeleceram laços de confiança e cooperação, somando-se a um número expressivo que já tinha essa experiência antes do levante.
Porém, por mais que seja importante essa aproximação, o decisivo para o futuro dos protestos está na capacidade dos movimentos proletários expandirem-se na nova conjuntura. Essa avaliação pode parecer a da esquerda tradicional segundo a qual os futuro dos protestos depende da “classe trabalhadora assumir o protagonismo” do movimento. Mas a diferença está no que se considera “movimento proletário”.
A esquerda eleitoral e mesmo a extrema-esquerda partidária quando fala em “movimento da classe trabalhadora” está pensando essencialmente em partidos, sindicatos e centrais sindicais. Mesmo José Arbex Jr, por exemplo, que evoluiu para posições mais radicais nos últimos anos, colocou não só nos partidos e sindicatos em geral, mas especificamente no PT e na CUT (!), o destino dos protestos e de todo o país: “O momento decisivo será a entrada em cena dos trabalhadores organizados em seus partidos e sindicatos. Apenas a ação organizada da classe operária tem a força necessária e suficiente para levar até as últimas conseqüências o movimento por conquistas sociais significativas […] Os dirigentes do PT e da CUT encontram-se agora numa encruzilhada definitiva: ou abraçam suas origens […] ou terão que enfrentar um formidável movimento de revolta que está apenas no seu início. A primeira alternativa conduzirá o Brasil a uma situação progressista […] a segunda estilhaçará o PT e a CUT e lançará o Pais no caos.” (“Dilma: rompa com os patrões!”, em Caros Amigos edição n. 196, junho/2013).
Tenho muita curiosidade em saber o que pensa Arbex hoje após prognósticos tão apocalípticos, depois das “direções do PT e da CUT” não terem feito nenhum movimento no sentido de “abraçarem suas origens”, muito pelo contrário…
Partidos de esquerda e sindicatos (e alguns movimentos como o MST) tiveram sua oportunidade de “momento decisivo” na “paralisação nacional” do dia 11/07, ainda com os protestos quentes, mas o resultado foi um fiasco quase total (aqui no Rio, ainda tivemos que assistir cenas vergonhosas de militantes do PCdoB agarrando black blocs e os entregando à polícia!). Nenhuma outra mobilização convocada e organizada pelas centrais sindicais conseguiu empolgar tanto como as chamadas “espontaneístas”.
Isso não quer dizer que o movimento sindical passou em brancas nuvens 2013. Como parte da multiplicação de lutas desde junho, o número de greves e paralisações teve um aumento expressivo, e em diversas categorias começam a germinar movimentos que questionam a burocratização e acomodação dos sindicatos. Os resultados maiores ainda estão para se ver, mas um caso específico mostra a potencialidade da luta sindical dos trabalhadores, quando seus métodos específicos são combinados com as novas formas de luta surgidas ou aperfeiçoadas no levante. Claro que estou falando da greve dos professores da rede pública do Rio de Janeiro entre agosto e outubro.
A greve foi deflagrada em assembléias nada massivas, contra a vontade da direção do Sepe (Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação), e parecia ser uma aventura de “anarquistas”, mas logo tornou-se uma mobilização impressionante da categoria, impulsionada principalmente pela conjuntura geral. A greve tornou-se o estopim para a retomada dos protestos populares em níveis semelhantes aos de junho, mostrando que a situação continua madura para novos levantes, desde que haja a combinação favorável de circunstâncias.
Para a categoria, os resultados (econômicos) foram decepcionantes, mas o aprendizado político foi fundamental. Em próximas greves, é preciso levar em conta uma deficiência fatal dessa última: o baixo envolvimento de alunos e pais com a greve, o que poderia ter feito toda a diferença, pois no setor de serviços públicos a pressão sobre o patrão (o Estado) é menos econômica (pois não existe aqui a possibilidade de “redução dos lucros”) que política (perspectiva de quebra de legitimidade e perda de votos), e nisso os “usuários” dos serviços têm papel fundamental. Esse foi um dos segredos da Comuna de Oaxaca no México (2006), que começou com reivindicação de professores e tornou-se uma experiência profunda de poder popular, cujas conseqüências para a luta proletária naquele país se fazem sentir até hoje. Os professores de Oaxaca e outras regiões do México têm um trabalho orgânico profundo com as comunidades indígenas, os principais “usuários” de seus “serviços”. Algo semelhante precisa ser construído entre os professores, as favelas e os bairros de periferia nas cidades brasileiras.
É bastante provável que a retomada de lutas sindicais se concentre nas categorias de serviço público, e isso cria um potencial de envolvimento da população muito importante. Em “A construção da estratégia…” já havia abordado em parte essa possibilidade:
“[…]o setor que mais têm se destacado, em volume e radicalização, nas lutas sindicais têm sido o dos “serviços”: educação, saúde, energia, comunicações, transportes, infraestrutura e administração urbana em geral. Foram estes, por exemplo, que fizeram as grandes greves e manifestações do final de 1995 na França, que marcou a retomada de grandes lutas sindicais na Europa. Isso não acontece por acaso, estes setores de “serviços” são precisamente aqueles em que o capital mais investe atualmente e nos quais busca criar novos campos de acumulação (daí a pressão para a privatização daqueles que ainda são em grande medida serviços públicos) que compensem o congestionamento de capital nos setores industriais tradicionais. Por conseguinte, o proletariado destes setores não só cresce numericamente em comparação com o dos setores industriais, mas é submetido a pressões de aumento das taxas de exploração significativamente maiores que a classe operária tradicional.”
O que faltou foi fazer a ligação com essa outra avaliação fundamental, que vou citar aqui embora seja um trecho longo, pois me economiza explicar o que entendo por “movimento proletário” atualmente:
“Porém, o mais importante é a contínua e crescente movimentação de classe dos setores mais empobrecidos e explorados: desempregados (subempregados, mal-empregados) em geral, habitantes das periferias, guetos e ruas, camponeses sem-terra, imigrantes e etnias oprimidas, etc. Temos defendido há algum tempo que esse é o setor mais dinâmico e de maior capacidade ofensiva do proletariado atualmente, e os últimos anos têm confirmado essa avaliação. Não se trata apenas da multiplicação quantitativa de motins, saques, ocupações, bloqueios e outras formas de luta que aos poucos vão se consolidando e se aperfeiçoando e se tornando tão características desse setor de pobres como as greves se tornaram em relação à classe operária tradicional. Trata-se que essas lutas vão se tornando cada vez mais organizadas e planejadas, mais efetivas em atingir o inimigo de classe, e mais decisivas em momentos concentrados de lutas de classes: levantes e insurreições. Desde os motins de Los Angeles em 1992 (ou antes, desde o caracazo venezuelano em 1989), têm se tornado mais freqüentes as ocasiões em que a movimentação de massas dos mais pobres determinou a direção de mudança das correlações de força e dos confrontos de classe: Chiapas em 1994, Albânia em 1997, Indonésia em 1998, Equador em 2000, Palestina (nova Intifada) em 2000, Argentina em 2001, Venezuela (insurreição que derrotou a tentativa de golpe) agora em 2002… Em alguns países latino-americanos, como Equador, Bolívia e principalmente a Argentina, bloqueios de estradas e outras formas de interromper a circulação de mercadorias já se converteram numa forma regular de luta econômica dos proletários mais pobres, com eficácia crescente. O mesmo acontece com as ocupações de terra (rurais) e terrenos em várias partes do mundo.”
O levante brasileiro de 2013 comprova este teorema? À primeira vista parece que não, mas é fato que as pautas das favelas, periferias, quilombolas, indígenas, sem-teto e juventude negra têm ocupado um papel cada vez mais central nas lutas desde junho, e marcaram o clima de tensão social que precedeu o levante. Aqui no Rio, boa parte do que aconteceu a partir de junho nas ruas foi antecipado na luta em torno da Aldeia Maracanã (ocupação do antigo Museu do Índio). Em todo o Brasil, os conflitos envolvendo a resistência indígena e a demarcação de terras se agravaram progressivamente nos últimos anos, chegando a um ponto de enfrentamento armado em vários casos (guarani-kaiowá, terena, povos do Xingu contra Belo Monte, etc). O mesmo em relação aos quilombolas, praticamente no país todo. Em São Paulo, o maior conflito antes da explosão de 2013 foi a batalha da Ocupação Pinheirinho no início de 2012, que teve repercussão nacional, e desde agosto desse ano, pelo menos, temos visto o maior ascenso dos últimos anos de ocupações de sem-teto e lutas contra despejos no estado. Os exemplos são muitos e se multiplicam…
Mas é na exacerbação da guerra brutal entre o proletariado e o braço armado do Estado racista e capitalista que toda a potencialidade e o drama da situação aberta pelos levantes de junho se revelam.
“A polícia que reprime na avenida é a mesma que mata na favela”
Essa frase, de um dos novos movimentos em que milito , foi posta numa faixa que estreou no protesto de 20/06 na Pres. Vargas. Reapareceu no dia 25/06 na Maré, no protesto dos moradores contra a chacina da noite anterior. As fotos com ela viralizaram rapidamente nas redes sociais e a frase virou meme na Internet. Isso só pode significar que tais palavras exprimiram uma identificação súbita entre as pessoas nas ruas tomadas pela insurgência, e as pessoas submetidas ao Estado de sítio permanente nas favelas e periferias.
Dificilmente os protestos de junho teriam a dimensão que tomaram se o Estado, através de sua face mais assassina, a Polícia Militar, não decidisse extinguir no nascedouro a rebeldia impertinente dos manifestantes. Foi o massacre e as prisões em massa (mais de 200 manifestantes) no protesto de 13/06 em São Paulo que geraram indignação nacional e acenderam o rastilho para a explosão nas ruas nas semanas seguintes.
A PM utilizou nas ruas apenas um limitado subconjunto do repertório de atrocidades que aplica regularmente nas quebradas e favelas para “disciplinar” o povo descendente de africanos e indígenas, e sustentar a ordem perversa dessa sociedade ainda em grande medida escravocrata e colonial. Mas foi o suficiente para despertar para a realidade aqueles ativistas, ou mesmo militantes de longa data que, mergulhados até então numa rotina de vida “pacífica”, ou em movimentos institucionalizados e bem comportados, nunca haviam contemplado a face medonha do apartheid brasileiro.
Houve, é claro, e ainda há, uma tendência de certos setores (principalmente jurídicos e acadêmicos) a restringir a denúncia do Estado da “ditadura democrática” às violações cometidas contra as manifestações. Mas aos poucos a compreensão de que a brutalidade dirigida aos protestos é apenas um caso particular e limitado de uma realidade permanente de exceção e genocídio vai se impondo. Aqui no Rio, o caminho para essa compreensão foi aberto traumaticamente, durante o levante, pela chacina da Maré, e depois, pelo seqüestro, tortura e assassinato de Amarildo de Souza pela UPP da Rocinha.
Daí a importância do posicionamento de acadêmicos como Giuseppe Cocco, professor da UFRJ com inequívoca formação e experiência de vida européia, que conseguem por em primeiro plano a característica fundamentalmente racista e colonial da sociedade brasileira, como na entrevista de 07/12 ao Instituto Humanitas Unisinos:
“O movimento [dos levantes de junho e outubro] não apenas nos diz que a separação da fonte (o povo) vis-à-vis do resultado (os representantes) é imoral, mas explícita, e torna visível que essa dimensão imoral do poder está baseada na violência de suas polícias. Ou seja, o movimento teve a capacidade de mostrar para o Brasil e para o mundo as dimensões perversas do monopólio estatal do uso da força no Brasil; um regime de terror de Estado que, por meio do regime discursivo sustentando pela mídia da elite neoescravagista, é tratado como se fosse ‘externo’ e independente dos governos […] Seria irônico se não fosse o cúmulo do cinismo escravocrata. É que a forma espúria de agir do Estado, ou conluio generalizado entre forças de polícias e crime organizado, no meio da histeria repressiva contra o tráfico de drogas, funciona como principal mecanismo de legitimação da guerra contra os pobres e contra suas mobilizações democráticas. Como sempre fez, desde junho, o poder multiplica os boatos sobre participação do narcotráfico nas mobilizações democráticas. Na senzala — ou seja, nas favelas, subúrbios e periferias — o terror anda a pleno vapor, quer a polícia seja do PSDB, do PT, do PSB ou do PMDB. É um terror estatal com vieses classistas e, sobretudo, racistas […] O que o movimento fez e faz não é praticar a violência, mas tornar explícita e visível a violência do poder e seus sistemas de (in)justiça, como do caso Amarildo […] A mesma coisa aconteceu com os mais de 10 moradores assassinados na favela da Maré em junho, durante o movimento, pela “Tropa de Elite” da PM do Rio e em relação à qual sequer existe um procedimento disciplinar. O movimento mostrou que os moradores da senzala não têm cidadania nem direito de lutar. A chacina da Maré foi um recado claro, genuinamente neoescravagista, aos pobres: vocês não têm direito de lutar e se lutarem serão mortos. Essa é a democracia que vivemos: não nos grotões do Brasil remoto, mas na metrópole olímpica, o Rio de Janeiro.”
Faltou acrescentar, ou destacar, que o “movimento” que revelou tudo isso não foi, em primeiro lugar, os protestos no centro da cidade, mas os protestos dos próprios favelados: dos moradores da Maré que desafiaram a PM que cercava a Nova Holanda e o Parque União em 25/06, e que forçaram a retirada do caveirão; e a dos parentes, vizinhos e amigos de Amarildo, que fecharam mais de uma vez o túnel Zuzu Angel em São Conrado, impedindo que o caso se tornasse mais um perdido e esquecido nas estatísticas policiais.
A luta aberta e inadiável contra esse terror de Estado tem que estar no centro das mobilizações doravante, para que toda a energia desatada pelos levantes não termine como uma distração passageira na longa história de silêncio e segregação do Brasil. Alguns avanços neste sentido já aconteceram, como a difusão da campanha pela desmilitarização das polícias, e a importante mobilização contra o genocídio do povo negro em Salvador, mas o principal é estender as estruturas e redes criadas contra a repressão nos protestos, para a proteção dos habitantes das favelas e periferias. Na Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência, há muito estabelecemos que um trabalho orgânico de autodefesa jurídica calcada em direitos humanos, e de denúncia qualificada utilizando as técnicas de comunicação e mídia alternativa, são essenciais para apoiar a resistência cotidiana dos povos contra a violência estatal.
No levante de junho, em pouco tempo se constituíram redes voluntárias de advogados e juristas (aqui no Rio através de grupos como o Habeas Corpus e instituições como a OAB e o IDDH) por um lado, e redes e grupos de midiativistas e comunicadores (os chamados “ninjas”), que tiveram papel fundamental na continuidade dos protestos. Isso mostra que há uma profunda analogia entre a resistência ao terror de Estado na favela e no “asfalto”. Mas é preciso descobrir como levar o ativismo jurídico e o midiativismo do “asfalto” para o terreno estranho e sombrio das quebradas ocupadas ou sitiadas pela polícia mais brutal do planeta.
2014?
Amanhã já será dia de voltar às ruas. Em épocas insurreicionais, os momentos da reflexão e da ação não têm como ser claramente separados. Mas temos que aperfeiçoar tanto a ação como a reflexão, porque os desafios das lutas em 2014 serão significativamente maiores que os de 2013. As oligarquias já se movem para saber como dosar repressão e engano neste ano que juntará Copa do Mundo, eleições gerais e sabe-se lá o que mais. Temos que nos mover rapidamente para tirar as lições da quantidade de fatos descomunais que vivemos em 2013.
Algo importante devemos reconhecer desde já: apesar das coisas grandiosas e novas que vivemos, ainda foram poucas e efêmeras as experiências de construção de órgãos de poder popular, como assembléias populares e comissões de luta por local de trabalho ou moradia. Neste aspecto, o levante brasileiro ainda está bastante aquém de experiências semelhantes em países como México, Argentina ou Bolívia, por exemplo. Descobrir como avançar nesse campo é um dos nossos principais desafios.
E não é um desafio somente para nós do Brasil. Se até junho tínhamos todas as razões para desejar que nenhum de nossos amigos e aliados do exterior viesse para cá engrossar o caldo da festa das elites na Copa, hoje precisamos e muito de sua presença e de sua ajuda. Em 2013 o Brasil, depois de longa espera, entrou finalmente no circuito dos levantes populares mundiais. Em 2014, há toda probabilidade que o país seja a escala mais importante desse circuito rebelde.
Maurício Campos, Dezembro de 2013
Fonte: http://www.redecontraviolencia.org/Artigos/927.html

What do Bosnia, Bulgaria and Brazil have in common? | ROAR Magazine

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Toma la palabra » Los mapas del 15M al 15O

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Negros são 70% das vítimas de assassinatos no Brasil, reafirma Ipea. | Negro Belchior

Negros são 70% das vítimas de assassinatos no Brasil, reafirma Ipea. | Negro Belchior

Por Douglas Belchior

Dados divulgados pelo Ipea dão conta de que assassinatos se relacionam à cor, condição social e escolaridade.


A pesquisa Participação, Democracia e Racismo?, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgada nesta quinta-feira apontou que, a cada três assassinatos no País, dois vitimam negros. Os dados foram apresentados pelo diretor Daniel Cerqueira, no lançamento da 4ª edição do Boletim de Análise Político-Institucional (Bapi).
Segundo a pesquisa, a possibilidade de o negro ser vítima de homicídio no Brasil é maior inclusive em grupos com escolaridade e características socioeconômicas semelhantes. A chance de um adolescente negro ser assassinado é 3,7 vezes maior em comparação com os brancos.
A pesquisa mostra ainda que negros são maiores vítimas de agressão por parte de polícia. A Pesquisa Nacional de Vitimização mostra que em 2009, 6,5% dos negros que sofreram uma agressão tiveram como agressores policiais ou seguranças privados (que muitas vezes são policiais trabalhando nos horários de folga), contra 3,7% dos brancos.
Segundo Daniel Cerqueira, mais de 60 mil pessoas são assassinadas por ano no País e há um forte viés de cor e condição social nessas mortes: “Numa proporção 135% maior do que os não-negros. Enquanto a taxa de homicídios de negros é de 36,5 por 100 mil habitantes, no caso de brancos, a relação é de 15,5 por 100 mil habitantes”
O diretor do Ipea afirma ainda que “Há uma perda na expectativa de vida devido à violência letal 114% maior para pessoas negras.  Enquanto o homem negro perde 20 meses e meio de expectativa de vida ao nascer, a perda do branco é de oito meses e meio”, explica Cerqueira.
De acordo com projeções do estudo, pelo menos 36.735 brasileiros de entre 12 e 18 anos serão assassinados até 2016, em sua maioria por arma de fogo, em caso de se manter o atual ritmo de violência contra os jovens. Trata-se do maior nível desde que o índice começou a ser medido em 2005, quando a taxa era de 2,75 adolescentes assassinados por cada mil.
Para Almir de Oliveira Júnior, pesquisador do Ipea, e Verônica Couto de Araújo Lima, acadêmica da área de Direitos Humanos da UnB, se no Brasil a exposição da população como um todo à possibilidade de morte violenta já é grande, ser negro corresponde a pertencer a um grupo de risco.
O estudo foi realizado pela Secretaria de Direitos Humanos do governo federal, pelo Fundo das Nações Unidas Para a Infância, o Unicef, pelo Observatório de Favelas e pelo Laboratório de Análise da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

Reflexão: O problema é social e não racial. Será?

The Turkish protests and the genie of revolution | ROAR Magazine

The Turkish protests and the genie of revolution | ROAR Magazine

 Jerome Roos (autor)
While the outcome remains uncertain, a closer look at the Turkish uprising reveals its intimate connection to the global struggle for real democracy.
ge·nie
noun
 /ˈjēnē/
genies, plural; genii, plural
A spirit of Arabian folklore, as traditionally depicted imprisoned within a bottle or oil lamp, and capable of granting wishes when summoned.
In 2011, a rebellious genie was let out of the suffocating bottle of the neoliberal world order. Ever since, world leaders have been struggling to put it back into place. This weekend, right when they started to feel that the genie had finally been contained, the revolutionary spirit arose once again in an unexpected location: in rapidly developing Turkey, a regional success story and darling of global capital and the neoliberal West. What began as a local struggle over the last green space in Istanbul’s urban landscape has now escalated into the biggest challenge to Erdogan’s 10-year rule and, according to some, “the most widespread civil unrest in Turkish history.” In an irony of historic proportions, the democratically elected leader who famously called on Mubarak and Assad to listen to their people and step down is now defying protesters with the same short-sighted authoritarian machismo of the dictators from whom he so avidly sought to distance himself.
For four days, Istanbul has been shrouded in thick clouds of tear gas as violent clashes between protesters and police have left the city’s streets resembling a war zone. On Saturday, police were forced to retreat from the iconic Taksim Square, which has since been occupied by tens of thousands of protesters. Violent demonstrations quickly spread to the capital, Ankara, and 70 other cities throughout the country. After Amnesty condemned the government’s brutal response to the initially peaceful protests, which left thousands injured and at least two dead, the protesters have become increasingly determined to push Erdogan from power. In a sign of their radical determination, protesters in Beşiktaş erected massive barricades and even commandeered an excavator, breaking through police lines in an attempt to reach the prime minister’s Istanbul office. Between the indignant roar of the protesters, the ominous hissing of the tear gas cannisters and the deafening sound of police sirens, one can slowly start to discern the revolutionary whispers of a newly empowered people.

The Seeds of a ‘Turkish Spring’?
But what do the protests really mean for Turkey, the region and the world more generally? In recent days, a heated debate has been raging in the leftist blogosphere over what to make of the spontaneous popular uprising that began on May 27. Do the protests hail the start of a Turkish Spring, as Richard Seymour was quick to claim in The Guardian? Or will they merely be a flash in the pan — the last convulsion of the white, urban and secular elite, which is bound to extinguish itself in a matter of days — as Zihni Özdil of Erasmus University Rotterdam argues in a critical analysis for Muftah? Are the struggles of Tahrir and Taksim connected? Can they even be compared?
To begin with, we need to reject not only the simplistic conflation of the Turkish uprising with the Arab Spring, but also the very notion of the “Arab Spring” as such. At the 2013 World Social Forum in Tunisia, the Arab revolutionaries deliberately refused to use the term Arab Spring, considering it an orientalist narrative invented by the Western media. Instead, they referred to the Arab revolutions, both to highlight their commonality as Arab uprisings, their nature as complex long-term processes, and their great diversity in terms of different national contexts and outcomes. In this sense, the Arab revolutionaries remind us that we cannot simply conflate the Syrian civil war with the “clean-cut” democratic transition in Tunisia, the failed uprising in Qatar, or the stalled revolution in Egypt. Similarly, we should refuse the simplistic orientalist impulse of heaping non-Arab Turkey onto the pile of “Arab Spring” uprisings.
Clearly, the political economic background in Turkey is very different from that of its revolutionary and war-torn Arab neighbors, as well as the crisis-stricken context of neighboring Greece and Cyprus. Unlike stagnant Egypt and collapsing Greece, Turkey’s economy has been booming for the past decade, and unlike war-torn Syria and most other authoritarian regimes in the region, Turkey has had relatively stable and democratically elected governments for decades. Both the Arab revolutions and the European anti-austerity protests clearly failed to resonate with the Turkish citizenry. In fact, back in 2011, while the entire Mediterranean was convulsing with social unrest, Erdogan’s Development and Justice Party (AKP) easily won free and fair elections with 50 percent of the vote and no serious electoral contestants.

A Local Rebellion: Fighting for the Right to the City
It all began with a peaceful sit-in in Gezi Park on the edge of Taksim Square, where some seventy protesters gathered on May 27 to prevent the destruction of one of the last-remaining green spaces in central Istanbul and its transformation into a shopping mall. The sit-in, quickly dubbed #OccupyGezi, was never simply an environmentalist protest about the trees or the park. Although the Greens featured prominently among the broad coalition of protesters — which also included socialists, anarchists, liberals and LGBTT activists — the sit-in was essentially a ‘Right to the City‘ protest: a notion first coined by Henry Lefebvre in 1968, who described it as a demand for “a transformed and renewed access to urban life.” The Marxist geographer David Harvey, who has written extensively on the subject in his latest book, describes the Right to the City as follows:
The right to the city is far more than the individual liberty to access urban resources: it is a right to change ourselves by changing the city. It is, moreover, a common rather than an individual right since this transformation inevitably depends upon the exercise of a collective power to reshape the processes of urbanization. The freedom to make and remake our cities and ourselves is, I want to argue, one of the most precious yet most neglected of our human rights.
As it turns out, over the past decade of his rule, prime minister Erdogan has increasingly neglected this most precious of human rights. As part of its neoliberal modernization program, the AKP has increasingly drawn the ire of citizens by ripping down one beloved site after another: from the destruction of the historic Emek movie theater and the port areas of Karaköy, Beşiktaş and Kadıköy, to the uprooting of up to 2.5 million trees for the construction of a widely unpopular third bridge across the Bosphoros. Almost all the historic and green sites facing destruction are making way for massive new shopping malls and other urban development projects that narrowly serve the interests of domestic and foreign businessmen. Most importantly, these projects are run through very unaccountable processes, favoring AKP cronies while leaving citizens with no voice whatsoever in the decisions that will shape the urban environment in which they live.
In other words, the #OccupyGezi protests did not just fall out of the sky. In a powerful article for Jadaliyya, Jay Cassano notes that “this protest is the latest manifestation of a movement that has been stirring for some time now. The shopping mall is only one component of a plan to entirely redesign Taksim Square into a more car-friendly, tourist-accommodating, and sanitized urban center.” What the protesters in Gezi Park were contesting is not so much the uprooting of the trees, but rather the relentless neoliberal drive towards the privatization of public space and its subsumption into a sanitized, denaturalized and dehumanized capitalist urban geography. Once we recognize this most basic element of the protesters’ claims, we are forced to jump a level to the national dimension of their grievances: the increasingly authoritarian means by which the Turkish state is seeking to complete this neoliberal drive towards the privatization of public space.

A National Revolt: Contesting Authoritarian Neoliberalism
The #OccupyGezi protests turned out to be a detonator sending a shockwave of popular indignation throughout Turkish society. When the police began their violent crackdown on the peaceful protesters assembled in the park, the images of brutality resonated powerfully with segments of the population that would never have considered camping out in a park or playing Beatles songs underneath Istanbul’s last-remaining trees. What the crackdown on #OccupyGezi revealed, in short, was the increasingly anti-democratic means by which Erdogan, his government and his fellow party members at the municipal level are pushing through their neoliberal agenda. On May 29, Erdogan said that “we have made our decision and we will implement it; you cannot do anything about it” — a statement that many took as a reflection of the prime minister’s increasing unwillingness to seek compromise and popular input on his policy decisions.
From the very beginning of the local #OccupyGezi protest, therefore, it was clear that there was something more at play than just the Right to the City. As Cemak Bural Tancel put it in an excellent piece building on his PhD research at the University of Nottingham, while resistance to the destruction of the city’s last remaining green space is crucial, “the meteoric rise of the occupation and the subsequent public outrage against the government signifies discontent with a broader trend that underpins the AKP’s reign since 2002: authoritarian neoliberalism.” This is where the so-called success story of Turkey as Europe’s fastest growing economy suddenly hits a wall and reveals its ugly face. Tancel notes that “while neoliberal policies have become part and parcel of Turkish economic administration since the 1980s, the AKP amplified the existing drive to an unprecedented extent.” Before 2003, for instance, the state implemented privatizations to the tune of $380 million per year; since Erdogan’s three terms in office, this has jumped up to an overwhelming $6 billion per year.

Despite widespread labor opposition and grassroots activism, Tancel observes that the government has single-mindedly “maintained its neoliberal onslaught on services, communities and the environment.” In the wake of the 2011 elections, the AKP’s neoliberalism took an even more “ferocious and disciplinarian form”, highlighted by unprecedented state repression of students, activists, journalists and lawyers. A report by a Turkish student platform claims that 771 students are currently locked up in prison on terrorism-related charges once concocted to crack down on separatist Kurdish activists, while a leading US journalism watchdog recently proclaimed Turkey the “world’s worst jailer” of journalists. According to a report by Human Rights Watch, the current legal framework “makes no distinction between an armed PKK combatant and a civilian demonstrator,” providing the government with virtually unlimited juridical opportunities to crack down on any form of peaceful political dissent. Meanwhile, Amnesty International has complained that “promised constitutional and other legal reforms did not occur. Instead, the right to freedom of expression was threatened and protesters faced increased police violence.”
At the same time as it pushed through this increasingly authoritarian neoliberal agenda, the AKP government has sought to legitimize its pro-elite and market-friendly rule by recourse to a quasi-fundamentalist cultural agenda pandering to the religious propensities of the country’s large and poor rural population. Attempts to limit the consumption of alcohol, ban the public display of affection, overturn the right to abortion, and many other infringements on basic civil liberties are seen by Turkey’s secular population as evidence of a creeping ‘Islamization’ of society. These fears have recently been stoked by the decision to name the third Bosphorus bridge after an Ottoman Sultan who virtually exterminated the country’s Alevi (i.e., non-Sunni Muslim) population, as well as the destruction of Gezi Park and the ‘modernization’ of Taksim Square, which will make way for the resurrection of an old Ottoman barracks complex that was once a base for the bloody persecution of Turkey’s sizeable secular population.
Of course, these fears and grievances play an important role in fomenting public discontent among secular Turks, but as Jay Cassano notes in his piece for Jadaliyya, “there is no indication that this is what ultimately brought thousands of people out into the streets.” The cultural politics of religious piety must therefore be firmly located within the government’s embrace of authoritarian neoliberalism as a guiding ideology and set of practices. In this sense, the current protests are less about the social cleavage between religious and secular Turks and much more about the global capitalist class cleavage that was so powerfully exposed during the 2009 demonstrations against the International Monetary Fund. In fact, the original Twitter hashtag for the Gezi protests was #DirenGeziParki, a resonant meme that was directly based on the name of the anti-IMF demonstrations that rocked Istanbul in 2009, which were publicly referred to as Diren Istanbul, or “Resist Istanbul” protests — later shortened to ResIstanbul.

A Global Uprising: The Struggle for Real Democracy
At this point, we clearly have to confront the unmistakable global and anti-capitalist dimension to the ongoing protests. The 2009 anti-IMF demonstrations that preceded the #OccupyGezi protests and that helped to shape the broad-based popular coalition that underlies the current uprising arose in a highly globalized context of financialized capitalism. Turkey’s 2001 financial crisis, occurring at the same time as Argentina’s, forced it to apply for a large IMF bailout, which inevitably came with all the usual neoliberal strings attached: from massive labor market reforms and firesale privatizations to the crackdown on trade unions and labor rights and the now familiar cutbacks in social spending. After ten years of IMF-imposed neoliberal reform and AKP-sponsored authoritarian implementation, the Bretton Woods Project concluded that, “over its long decade with the IMF, Turkey managed to replace public deficits with a democracy deficit.”
It is here that we finally arrive at the crux of the protesters’ broader claims — and the connection with ongoing struggles in Cairo, Madrid, Athens, New York, Santiago de Chile, Mexico City and Frankfurt. The Turkish protests are not just a local rebellion against the destruction of a park, nor just a national revolt against increasing authoritarianism and creeping Islamic fundamentalism. Much more than this, the Turkish uprising appears to be a local and national manifestation of a global struggle for real democracy. As Agnes Czajka and Bora Isyar wrote for Jadaliyya this weekend, “the protesters are adamant that theirs is the cause of democracy.” No surprise, then, that the Turkish struggle is resonating so strongly with the concerns of people in widely divergent geographical, political and socio-economic contexts; people who at first sight may share nothing in common — and who may not even know about or be in direct contact with another — but who upon deeper inspection are embedded in the same suffocating structure of global capitalism, and who confront the same crippling legitimation crisis of traditional political institutions.

The critical structural factor is simply the rise of global finance and transnational production networks, combined with the increasing authority of international financial institutions like the IMF, the World Bank and the European Central Bank, which have been quietly chipping away at the ability and willingness of nation states — and the governments that administer them — to look after the interests of their own citizens. Indeed, a systemic imperative has emerged that forces governments of any political conviction to dance to the tunes of global markets or to face the repercussions in the form of reduced growth, rising unemployment, and an increased likelihood of being ejected from power by disaffected voters or rebellious social forces. In this context, the manoeuvrability of national governments has been greatly constricted through limitations on monetary and fiscal policy options, leaving policymakers with symbolic politics to gain and maintain the support of voters. This is the context in which authoritarian neoliberal populism thrives, while democracy suffers.
As I pointed out in a recent conference paper, these dynamics of diminishing state control over global flows of investment and transnational networks of production have fed into a widespread crisis of representation. In some countries, the crisis of representation was already obvious: Ben Ali and Mubarak were dictatorial puppets of global capital and the neoliberal West — they retained their power through the manipulation of election results and the violent suppression of popular opposition. They clearly did not represent the average citizen. In Europe and the United States, by contrast, the anti-democratic nature of government was more difficult for people to see at first, but since the financial crash of 2008 and the subsequent debt crisis, the crisis of representation has spread through the West like a wildfire. As people around the world are losing faith in traditional political processes, a gaping democratic deficit is exposed at the heart of all capitalist states: from pre-revolutionary Egypt to crisis-ridden Greece, and from the “free” United States to nominally democratic Turkey.

Will Taksim Square Become Erdogan’s Tahrir?
Here emerges a clear connection between the Taksim protests and the Tahrir revolt. While Mubarak’s regime was in many ways the opposite of Erdogan’s, Mubarak ultimately faced the same structural limitations. Forced by the IMF and global markets to liberalize the economy, privatize state assets and reduce state subsidies for the poor, Mubarak found himself increasingly unable to legitimize his regime. Unlike Erdogan, the secular regime in Egypt refused to resort to the politics of religious piety to stabilize its cultural hegemony over society — and eventually paid the price in terms of a popular uprising led by a curious revolutionary coalition of secular middle-class activists and poor Muslim workers and slum-dwellers. The restored balance of power that subsequently aborted the revolutionary process under the aegis of the Muslim Brotherhood in fact repeated many of the strategies of Erdogan’s AKP: in order to re-legitimize the globally-integrated capitalist state and the dominant military-industrial complex, corporate and military elites had to compromise on cultural politics in order to retain their economic predominance and their privileged political position, in turn providing new political space to the religious fundamentalists.
In this sense, those who hail the Turkish uprising as the advent of a “Turkish Spring”, like Richard Seymour, are getting reality the wrong way around: in many ways, the uprising in Turkey is an Arab Spring in reverse — it starts from the premise of a nominally democratic but factually authoritarian regime that legitimizes its rule through the cultural politics of religious piety, just as post-revolutionary Egypt does under the Muslim Brotherhood. Unlike the Egyptian revolution, therefore, it will be much more difficult for the Turkish protesters to craft a revolutionary coalition between secular middle class activists and poor Muslims — just as the secular revolutionaries of Tahrir find themselves politically isolated in the current post-revolutionary constellation of social forces in Egypt. This difficulty is further compounded by the Turkish state’s clampdown on the media (state and corporate TV are massively downplaying the protests) and the removal of police from Taksim, both of which serve to reduce the public visibility of the protests and therefore lessen the likelihood of poor Muslims joining the rebellion.
At the same time, those who therefore presume that the “objective conditions for a popular uprising are not present” in Turkey — as Zihni Özdil does — are equally wrong. According to Özdil, Erdogan remains immensely popular among the country’s poor and deeply religious majority while organized labor is barely involved in the protests; two factors that prohibit the emergence of a genuine revolutionary coalition that could contest the structural power and cultural hegemony of Erdogan and the AKP. These two observations, however, are no guarantee that disaffected social groups will continue to abstain from joining the burgeoning protest movement at a later point. Here we have to remember how the Egyptian revolution itself unfolded: the initial protests of #25J largely started out as a rebellion of young, highly-educted, and secular middle-class radicals — most importantly those associated with the April 6th Youth Movement — with years of experience in anti-capitalist activism. It was only through days of teeth-grinding grassroots organization that these protesters managed to mobilize Cairo’s slum-dwellers and religious poor to give volume to the protests, as well as football hooligans to fight in the front-lines.

The Working Class as the Key to Revolution
While this is by no means guaranteed, a similar coalition may yet emerge in Turkey. It all depends on whether the current coalition of protesters on the streets manages to actualize the hidden potentialities for revolt that already lie hidden within the marginalized segments of Turkey’s population, which in turn relies on active grassroots organizing among the country’s working class and disaffected poor. As Zeynep Gambetti notes in her ROAR article of this weekend, the constituency of the protests is already characterized by a “curious coalition” made up of a great variety of social forces, mostly middle-class leftists, liberals and anarchists, but also including the football hooligans that Egyptian revolutionaries only managed to mobilize at a later stage in their revolutionary process. The key to the further escalation of the uprising is now the large-scale mobilization of the working class.
According to Özdil, labor mobilization is a practical impossibility as the “objective conditions” for it are absent. This assumption seems to me like a simplistic and premature conclusion. Indeed, in a crucial article, Sungur Savran informs us that there are actually two major strikes waiting in the wings: first, the Federation of Public Employees’ Unions had already (independently of the ongoing protests) declared a sector-wide strike for June 5, which, if successful, could paralyze large parts of the Turkish state apparatus. It is the second strike, however, that poses the greatest threat to the government: metal workers have also previously and independently called a strike due to start in June, which may now coincide with the massive unrest on the streets. These 100,000 metal workers, if they mobilize in sufficient numbers, just happen to have the power to completely shut down the main export engine of Turkey’s manufacturing sector, with potentially catastrophic implications for the government.
In this already explosive situation, the possible confluence of these two strikes shutting down both the public sector and the country’s main export engine would open up a host of unpredictable consequences. As Savran notes, “the present moment witnesses a people’s revolt in the face of the arrogance and repressive practice of the government. Should this be combined with an insurgent working-class movement, Turkey would become open to all kinds of revolutionary change.” Clearly, Taksim is not (yet) Tahrir, and it is unclear whether it can ever become another Tahrir, given the radically divergent political-economic context. But that does not mean that the Turks cannot craft their own path to revolutionary social change if they play the game right, crafting a broad-based popular coalition involving massive workers’ mobilization — and putting enough pressure on the economy to destabilize and pry open the governing coalition of the Islamic AKP and the secular army.
None of this is guaranteed, and no one can at this point claim with any certainty what the outcome of the uprising will be. But one thing is for sure: just a week ago, few people would have dared to predict that the once stable economic giant on the bridge between the East and the West would reach such a dramatic state of social unrest. Two years after the Arab revolutionaries and Greek anti-austerity protesters first kicked off the Real Democracy Movement, the global cycle of contestation has finally come full circle in the Bosphorus. The revolutionary spirit of 2011 has resurrected itself — and today it is the brave young Turks who are carrying it forward. Whatever world leaders may try, the rebellious genie that animated the global uprisings of the past two years just won’t go back into its suffocating neoliberal bottle. In these times of grave social upheaval, revolutionary change is no longer just a far-fetched ideological abstraction — it is once again a distant but very real possibility.
Jerome Roos is a PhD researcher at the European University Institute and the Founding Editor of ROAR Magazine.